quarta-feira, 30 de abril de 2008

A MEDIDA DE EXIBIÇÃO NO PROCESSO CIVIL

A doutrina brasileira reconhece três espécies de pedidos de exibição: a exibição como objeto de ação cautelar antecedente, a exibição como objeto de ação cognitiva satisfativa e, finalmente, a exibição incidental com finalidade probatória no processo de conhecimento. A “ação cautelar antecedente de exibição” sempre se baseia na necessidade de preservação emergencial do documento ou da coisa que se encontre em estado de perigo, para que seja possível a instrução do futuro processo principal. Diferentemente, a ação autônoma e cognitiva de exibição” sempre advém de uma relação jurídica que gera para o requerente da medida o direito material de conhecer o documento ou a coisa cuja apresentação é almejada. Por essa razão, esta ação processual revela um nítido caráter satisfativo que lhe retira todo e qualquer resquício de cautelaridade, mesmo que o documento mostrado pelo requerido possa ser utilizado como meio de prova em outro processo judicial. Por sua vez, a “exibição incidental probatória” nunca decorre de uma ação processual cautelar ou satisfativa, mas sim do poder instrutório do qual está investido o magistrado e que lhe autoriza ordenar, no curso do processo de conhecimento, a apresentação de documento importante para a prova de algum fato jurídico relacionado à lide. Por essa razão, a exibição incidental probatória pode ser determinada de ofício pelo juiz ou a requerimento da parte que demonstrar legítimo interesse na produção da prova documental.
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REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:
1. MACIEL, Daniel Baggio. Processo Cautelar. São Paulo. Editora Boreal, 2012.

terça-feira, 29 de abril de 2008

A EXECUÇÃO CIVIL DA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA

O artigo 475-N do CPC relaciona a sentença penal condenatória transitada em julgado entre os títulos executivos judiciais que podem ser exigidos mediante o procedimento definido pelos artigos 475-J e seguintes. Na verdade, para que uma sentença penal condenatória configure título executivo passível de execução civil são necessários dois pressupostos: 1) que ela tenha transitado em julgado (CF, art. 5º, LVII); 2) que o delito praticado pelo agente haja resultado algum prejuízo a ser reparado. Havendo sentença penal condenatória passada em julgado, em geral é desnecessário que a vítima maneje a chamada “actio civilis ex delicto”, ou seja, a ação de conhecimento condenatória à indenização contra o infrator penal. Basta que ela requeira no juízo cível a liquidação da sentença penal, ademais, este julgado não estabelecerá o montante devido (art. 475-A e seguintes). A liquidação será decidida mediante interlocutória agravável por instrumento (art. 475-H), após o que o devedor será intimado para pagar no prazo de 15 dias, sob pena de multa de 10% e, a requerimento do credor e observado o artigo 614-II, expedir-se-á o mandado de penhora e avaliação (art. 475-J). Assim, por força do inciso IV do artigo 575 da Lei dos Ritos, a liquidação do débito e o cumprimento dessa sentença devem ser requeridos no "juízo cível", competência esta que é material e, portanto, absoluta. Entretanto, também é preciso lembrar que a competência de foro é a do local do ato ou fato, conforme o artigo 100, V, “a” do CPC, que é relativa porque territorial. Em conclusão, é o juízo cível do local do ato ou fato que titulariza a competência para processar a liquidação e o correspondente cumprimento da sentença quando houver prejuízo a ser ressarcido pelo infrator à vítima.
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1. MACIEL, Daniel Baggio. A execução civil da sentença penal condenatória. Araçatuba: Página eletrônica Isto é Direito. Abril de 2008. 

sexta-feira, 25 de abril de 2008

A DEFINIÇÃO DE ESPONSAIS

A resposta é simples: esponsais ou promessa esponsalícia, do latim “sponsus” (esposo), importa o compromisso de casamento que duas pessoas de sexos diferentes fazem reciprocamente, com a finalidade de que se conheçam melhor para que aquilatem suas afinidades e gostos. Na sociedade tradicional, os esponsais praticamente se confundem com o noivado ou cerimônia antenupcial. Embora o ordenamento imperial tenha regulado os esponsais, eles não foram previstos expressamente pelo Código Civil de 1916 e tampouco pelo Código atual. Nada obstante, a doutrina normalmente aceita que a ruptura da promessa de casamento por motivo não plausível pode acarretar a responsabilidade civil extracontratual com base no artigo 186 do novo Código, afinal, “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Fundados especialmente nesse dispositivo legal, vários escritores entendem possível a responsabilização patrimonial daquele que ensejar o rompimento do noivado, desde que a promessa tenha sido feita livremente pelos noivos, que tenha havido a recusa tácita ou expressa de cumprir a promessa esponsalícia, que haja a ausência de justo motivo, bem como danos materiais ou morais a serem indenizados. Nos tribunais o tema nunca foi tão pacífico, mas há julgados deferindo indenizações em casos tais, como se infere da seguinte ementa emanada do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (EIAC 200791-0/2): “O namoro prolongado, o noivado oficial, a aquisição das alianças e a construção da casa, por si sós, levam à segura dedução de que se tratava de relacionamento sério, de atos preparatórios de futuros cônjuges, dispensando uma promessa formal de casamento. O rompimento injustificado da promessa de casamento enseja indenização por dano moral, consistente na penosa sensação da ofensa, da humilhação perante terceiros, na dor sofrida, enfim, nos efeitos puramente psíquicos e sensoriais experimentados pela vítima da lesão. A ruptura do noivado acarreta indenização por danos materiais, provado que a mulher contribuiu para a construção de uma casa. Não há lugar para indenização pelo enxoval confeccionado pela noiva se ele continua em seu poder, sem lhe causar desfalque patrimonial, uma vez que a reparação se condiciona à constatação de efetivo proveito de uma parte em detrimento da outra.”
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1. MACIEL, Daniel Baggio. A definição dos esponsais. Araçatuba: Página eletrônica Isto é Direito. Abril de 2008.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

NOTA SOBRE O AGRAVO ORAL

O § 3º do artigo 523 do Código de Processo Civil estabelece que o agravo das decisões interlocutórias proferidas na audiência de instrução e julgamento deverá ser interposto oral e imediatamente, para constar do respectivo termo, nele expostas sucintamente as razões do recorrente. Como toda norma restritiva, esta também deve ser interpretada restritivamente, de modo que somente deve ser oral o agravo interposto das decisões interlocutórias proferidas na “audiência de instrução e julgamento”, não aqueles manejados contra interlocutórias emitidas nas demais espécies de audiência existentes no processo civil (CPC, art. 804 e 928). Além de oral, agravo normatizado no mencionado parágrafo segue a regra contida na primeira parte do artigo 522, qual seja, a de que ele é retido, salvo na hipótese de a decisão interlocutória puder causar à parte lesão grave de difícil reparação, caso em que caberá o agravo de instrumento no prazo de 10 dias, mediante petição escrita diretamente no tribunal. A interposição do agravo oral deve ser “imediata”, vale dizer, logo após a emissão da decisão interlocutória, sob pena de preclusão. Entretanto, para dinamizar o trâmite da audiência, nada impede que o juiz da causa faculte ao recorrente construir as razões do seu agravo somente após a ouvida das partes, das testemunhas, dos peritos e dos assistentes técnicos. Aliás, é preferível que seja assim porque durante a audiência de instrução e julgamento o juiz pode emitir sucessivas decisões interlocutórias e não faz o menor sentido formular separadamente vários agravos na mesma ocasião. Finalmente, vale observar que o Código não estabeleceu o tempo para o agravante produzir oralmente as suas razões recursais. Por isso, acreditamos adequada a analogia ao artigo 454, que prevê o prazo de vinte minutos, prorrogáveis por mais dez, a critério do juiz. Por simetria, o agravado também deverá responder ao recurso na própria audiência, valendo-se do mesmo prazo que o juiz conceder para o agravante apresentar as suas razões.
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1. MACIEL, Daniel Baggio. Nota sobre o agravo oral. Araçatuba: Página eletrônica Isto é Direito. Abril de 2008.

terça-feira, 22 de abril de 2008

DIFERENÇAS ENTRE A TUTELA CAUTELAR E A TUTELA ANTECIPADA

As tutelas cautelares (CPC, art. 796 e seguintes) e as tutelas antecipatórias (CPC, arts. 273, 461 e 461-A) são muito comuns no meio forense. Na verdade, ambas são descendem de um tronco comum, que é o das tutelas de urgência. Nada obstante, elas apresentam diferenças significativas que merecem ser lembradas para que essas medidas não sejam confundidas na teoria e na prática. Uma das distinções que a doutrina tem visualizado entre elas refere-se à "satisfatividade" do provimento outorgado pelo juiz. Enquanto as tutelas antecipadas resultam a satisfação prematura de um ou mais efeitos do provimento que se espera obter na sentença ou no acórdão, as tutelas cautelares apenas asseguram temporariamente o direito provável contra o risco de lesão que o aflige, sem, contudo, realizá-lo de forma adiantada. A título de exemplo, se um conveniado manejar uma ação de conhecimento cominatória da obrigação de fazer pretendendo impor a um convênio médico a realização de uma cirurgia que lhe foi recusada, qualquer provimento que ordene incidentalmente a intervenção em favor do paciente constituirá antecipação da tutela, afinal, ele será satisfativo do direito afirmado pelo requerente. No entanto, se um devedor estiver na iminência de dissipar os bens que possui e o credor postular a necessária constrição patrimonial para a proteção do direito de crédito ameaçado de dano, estaremos diante de uma tutela visivelmente cautelar, mesmo porque os bens do demandado não serão transmitidos ao domínio do credor, mas sim conservados em poder de um depositário aguardando o desenrolar da futura execução, na qual poderão ser penhorados. Portanto, neste caso a tutela jurisdicional não resulta a satisfação do direito do credor, senão a mera segurança dele. Nessas condições, pode-se dizer que a tutela antecipada corresponde a uma "execução para a segurança", enquanto que a medida cautelar importa uma "segurança para a execução". Não é por outro motivo que os requisitos de concessão das tutelas antecipadas no artigo 273 são bem mais rigorosos do que aqueles reclamados para o deferimento das medidas cautelares (o "fumus boni iuris" e o "periculum damnum irreparabile"). Finalmente, sob um outro prisma, também é possível dizer que quando o juiz lida com a tutela antecipada, ele opera sobremodo no "plano do direito", afinal, aqui haverá uma deliberação bastante densa sobre a existência do direito afirmado pela parte. O mesmo não ocorre com as medidas cautelares, nas quais o juiz manobra preponderantemente no "plano dos fatos" para inferir o risco e a simples plausividade do direito alegado pelo requerente. Portanto, em matéria de tutela cautelar, a declaratividade do direito é bem mais rarefeita do que aquela reclamada para o deferimento de medidas antecipatórias.
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1. MACIEL, Daniel Baggio. Diferenças entre a tutela cautelar e a tutela antecipada. Araçatuba: Página eletrônica Isto é Direito. Abril de 2008.
2. Este breve artigo foi escrito a pedido de um dos nossos leitores.

segunda-feira, 21 de abril de 2008

UMA BREVE COMUNICAÇÃO SOBRE A AÇÃO MONITÓRIA NO DIREITO BRASILEIRO

Em meados da década de 90, quando se iniciou o movimento reformista do CPC de 1973, foi editada a Lei 9079/1995, que instituiu a ação monitória no ordenamento jurídico brasileiro. Ela está regulada nos artigos 1102-A, 1102-B e 1102-C da Lei dos Ritos e pode ser manejada por aquele que pretender, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel. Como é visível, o direito brasileiro adotou o "procedimento monitório documental", pois o autor desta ação processual deve exibir, logo na petição inicial, a prova escrita representativa do seu crédito. Essa prova documental não pode ostentar eficácia de título executivo, pois, do contrário, haverá falta de interesse-adequação para o manejo da ação de injunção (CPC, art. 267, VI). A prova escrita a que se refere o artigo 1102-A pode ser qualquer documento informal, a exemplo de cartas, fac-simile, telegramas, guias de internação, requisição de serviços, ou mesmo títulos de crédito já alcançados pela prescrição executiva, como cheques, notas promissórias, letras de câmbio, duplicatas, etc. Enfim, a prova escrita necessária à ação monitória deve expressar uma das obrigações acima referidas e permitir ao juiz inferir, em sede de cognição sumária, a autenticidade do documento e a verossimilhança da alegação. Se a petição inicial estiver devidamente instruída, o requerido será instado a satisfazer a obrigação em 15 dias, caso em que desfrutará de um importante benefício, qual seja, a isenção do pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios. Alternativamente, ele tem a opção de embargar no mesmo prazo, hipótese na qual o procedimento monitório se transformará em ordinário até a final sentença. Se o requerido não cumprir a obrigação no prazo legal, não manejar os embargos, ou se estes forem inadmitidos ou improcedentes, constituir-se-á de pleno direito o título executivo judicial e o credor poderá prosseguir em execução, hoje denominada "cumprimento de sentença". Sobre os embargos ao mandado monitório há duas curiosidades, quais sejam, eles são processados nos mesmos autos originários da ação monitória e independem da prévia segurança do juízo, isto é, de penhora ou depósito judicial do objeto disputado pelas partes.Embora inicialmente alguns escritores tenham manifestado um certo preconceito quanto à utilização da ação monitória contra a Fazenda Pública, hoje está pacificado o entendimento de que há legitimação passiva para demandá-la nesta ação processual, desde que o credor seja portador de algum título extrajudicial desprovido de eficácia executiva. Desde a Lei 9079, as ações monitórias têm sido amplamente utilizadas no Poder Judiciário, notadamente pelas instituições financeiras na cobrança de dívida fundada em extratos de movimentação de conta-corrente e em contratos de "cheque-especial".
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1. MACIEL, Daniel Baggio. Uma breve comunicação sobre a ação monitória no direito brasileiro. Araçatuba: Página eletrônica Isto é Direito. Abril de 2008.
2. Este breve comunicado sobre a ação monitória foi escrito a pedido de um dos nossos leitores.

sábado, 19 de abril de 2008

O PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL

Todos sabem que o Código de Processo Civil elenca um número expressivo de recursos possíveis contra decisões judiciais, a saber: apelação, embargos de declaração, agravo, embargos infringentes, recurso ordinário, recurso especial, recurso extraordinário e embargos de divergência (art. 496). Cada um deles tem suas hipóteses de cabimento delineadas na legislação processual, a exemplo da apelação, que é manejável contra sentença definitiva ou terminativa (art. 513). Portanto, ao disciplinar o sistema recursal brasileiro, o legislador processualista definiu as espécies recursais segundo a natureza da decisão judicial hostilizada, o que torna sobremodo fácil identificar o recurso adequado em cada caso concreto. Entretanto, nem sempre o Código de Processo Civil esclarece com precisão qual é a natureza da decisão judicial e acaba proporcionando dúvidas sinceras a respeito do recurso cabível na hipótese. Exemplo disso se dá com a decisão que julga a exceção de incompetência (art. 311), cuja índole não foi revelada expressamente pela Lei dos Ritos. Para mediar essas incertezas e os possíveis equívocos na identificação do recurso correto, doutrina e jurisprudência aceitam bem o chamado "princípio da fungibilidade recursal", segundo o qual o órgão judicial pode admitir o recurso inadequado em lugar daquele que deveria ser interposto pelo recorrente. Este princípio é, sem dúvida, uma decorrência do "princípio da instrumentalidade das formas". Entretanto, diferentemente do CPC de 1939 (art. 810), o Código de 1973 não possui qualquer dispositivo regulando a fungibilidade dos recursos, o que abre espaço para que a literatura e os tribunais forneçam-lhe os contornos. Um dos pressupostos que normalmente se exige para essa substituição recursal é a existência da chamada "dúvida objetiva", isto é, aquela resultante de divergências doutrinárias e jurisprudenciais quanto ao recurso correto em um determinado caso. Embora não concordemos, alguns escritores ainda sugerem um segundo requisito para tanto, qual seja, a "tempestividade". Segundo estes, o recurso inadequado deve ser interposto no prazo do recurso correto, sob pena de não conhecimento.
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1. MACIEL, Daniel Baggio. O princípio da fungibilidade recursal. Araçatuba: Página eletrônica Isto é Direito. Abril de 2008.
2. Este breve artigo foi escrito a pedido de um dos nossos leitores.

AS CLASSIFICAÇÕES DAS MEDIDAS CAUTELARES NO CPC

O Código de Processo Civil é um diploma legal dotado de notória vertente didática. Ao regular as medidas cautelares, ele revela duas classificações amplamente disseminadas pela doutrina e de aceitação irrestrita pelo Judiciário. Uma delas separa as medidas cautelares "quanto à existência de regulação expressa" e a outra "quanto ao momento da outorga pelo juiz". Quanto à existência de regulação expressa, as medidas cautelares podem ser classificadas em: a) nominadas, típicas ou específicas, a que correspondem todas aquelas disciplinadas expressamente pelo Código no Capítulo II do Livro III, sob o rótulo dos "procedimentos cautelares específicos", a exemplo do arresto, do sequestro, da caução, da busca e apreensão, da exibição, da produção antecipada de provas, dos alimentos provisionais, do arrolamento de bens; b) inominadas, atípicas ou inespecíficas, nas quais se inserem todas aquelas que não estão reguladas ostensivamente pela legislação, mas que são passíveis de concessão pelo juiz porque compreendidas no poder cautelar geral de que trata o artigo 798. Conforme a dicção do artigo 796, quanto ao momento para outorga pelo juiz, as medidas cautelares podem ser classificadas em: a) medidas antecedentes ou precedentes (art. 800), as quais são concedidas antes do ajuizamento da ação principal e mediante o exercício da verdadeira ação cautelar; b) medidas cautelares incidentais, vale dizer, todas aquelas deferidas pelo juiz durante o trâmite do processo principal. As medidas cautelares antecedentes são comumente denominadas "preparatórias" por várias literaturas. Em que pese o uso recorrente dessa expressão, como bem observou THEODORO JÚNIOR, é impróprio utilizá-la porque a medidas cautelares antecedentes "nada prepararam" para o futuro processo principal e tampouco atuam como condições ou requisitos para o manejo de outras ações judiciais. Por índole e finalidade, elas somente têm a finalidade de prevenir o dano ao direito provável. Por isso, mesmo que tais providências não sejam requeridas antes, nada impede que a parte ajuíze normalmente a ação principal, de conhecimento ou execução.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
1. MACIEL, Daniel Baggio. Processo Cautelar. São Paulo: Editora Boreal, 2012.
2. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo Cautelar. São Paulo: Editora Leud, 1995.

GENERALIDADES SOBRE A PENHORA "ON LINE"

O artigo 655 do Código de Processo Civil estabelece uma espécie de ordem preferencial e relativa para a penhora de ativos do executado. Ao fazê-lo, esse dispositivo legal aponta em primeiro lugar a constrição de dinheiro em espécie, em depósito ou aplicação em instituição financeira. Uma das grandes vantagens da penhora de dinheiro ou de valores mantidos em instituições bancárias é a agilidade com a qual a execução judicial se desenvolverá, afinal, não será necessário avaliar os bens do devedor e tampouco expropriá-los mediante certos procedimentos burocráticos previstos na lei processual. O bloqueio de valores depositados em instituições financeiras é realizado por ordem do juiz dirigida à autoridade supervisora do sistema bancário, isto é, ao Banco Central do Brasil (art. 655-A). Essa requisição é feita mediante o uso da informática e de um “software” especialmente desenvolvido para tanto, o “Bacen-Jud”. Daí o nome “penhora on line”, mas que, na verdade, corresponde a um mecanismo de bloqueio eletrônico de importâncias depositadas em instituições bancárias, seguido da posterior penhora efetivada pelo oficial de justiça. Para o manejo desse programa, o magistrado deve fazer uso de uma senha pessoal, a fim de preservar o sigilo da vida bancária do executado. Embora eficiente, esse mecanismo deflagrador da penhora de valores pode acabar vinculando ativos originários de salários, proventos, vencimentos e outros rendimentos dotados de natureza alimentar, caso em que cabe ao executado provar-lhe a origem e requerer ao juiz a liberação da quantia bloqueada (§ 2º), independentemente da oposição de embargos ou de impugnação ao cumprimento da sentença. No mais, cabe ressaltar que, dentre os bens absolutamente impenhoráveis, o artigo 649 do Código de Processo Civil acabou relacionando o saldo de até 40 salários mínimos depositados em conta de poupança, de modo que essa tal penhora "on line” só pode incidir sobre as reservas que excederem esse patamar (inc. X). Porém, se o crédito objeto da execução ostentar natureza alimentar, não há que se cogitar da impenhorabilidade destes.
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1. MACIEL, Daniel Baggio. Generalidades sobre a penhora "on line". Araçatuba: Página eletrônica Isto é Direito. Abril de 2008.

AS DIFERENÇAS DA DEPORTAÇÃO, DA EXPULSÃO E DA EXTRADIÇÃO NO ESTATUTO DO ESTRANGEIRO

No Brasil, é a Lei 6815/1980 que instituiu o Estatuto do Estrangeiro. São vários os assuntos regulados nessa legislação especial, dentre os quais merecem destaque a deportação, a expulsão e a extradição. Embora essas expressões sejam usadas popularmente como se fossem sinônimas, elas possuem significados e casuísticas diferentes, que merecem ser lembradas. Das três providências de retirada do estrangeiro do Brasil, a mais branda é a deportação (art. 57). Ela tem cabimento quando o estrangeiro ingressa ou permanece irregularmente em território nacional, sem o necessário visto em qualquer das suas modalidades (de trânsito, turista, temporário, permanente, de cortesia, oficial ou diplomático – art. 4º). A expulsão é efetivada quando o estrangeiro atentar contra a segurança nacional, a economia popular, a ordem política e social, a tranquilidade ou moralidade pública, ou cujo procedimento o torne nocivo à conveniência e aos interesses nacionais (art. 65). Por sua vez, a extradição é deferível quando o governo requerente se fundamentar em tratado para postulá-la ou quando prometer ao Brasil reciprocidade (art. 76). No artigo 77 estão alguns casos em que não se concederá a extradição e que se convertem em verdadeiros requisitos negativos da remessa da pessoa ao estrangeiro: I - se tratar de brasileiro, salvo se a aquisição dessa nacionalidade verificar-se após o fato que motivar o pedido; II - o fato que motivar o pedido não for considerado crime no Brasil ou no Estado requerente; III - o Brasil for competente, segundo suas leis, para julgar o crime imputado ao extraditando; IV - a lei brasileira impuser ao crime a pena de prisão igual ou inferior a um ano; V - o extraditando estiver a responder a processo ou já houver sido condenado ou absolvido no Brasil pelo mesmo fato em que se fundar o pedido; VI - estiver extinta a punibilidade pela prescrição segundo a lei brasileira ou a do Estado requerente; VII - o fato constituir crime político; VIII - o extraditando houver de responder, no Estado requerente, perante tribunal ou juízo de exceção. A exceção do item VII não impedirá a extradição quando o fato constituir principalmente infração da lei penal comum ou quando o crime comum, conexo ao delito político, constituir o fato principal. De todo modo, caberá exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal a apreciação do caráter da infração, órgão este que poderá deixar de considerar crimes políticos os atentados contra chefes de Estado ou quaisquer autoridades, bem assim os atos de anarquismo, terrorismo, sabotagem, sequestro de pessoa ou que importem propaganda de guerra ou de processos violentos para subverter a ordem política ou social.
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1. MACIEL, Daniel Baggio. As diferenças entre a deportação, a expulsão e a extradição no Estatuto do Estrangeiro. Araçatuba: Página eletrônica Isto é Direito. Abril de 2008.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

RESPONSABILIDADE PELA MÁ CONSERVAÇÃO DAS VIAS PÚBLICAS

Em um país como o nosso, com arrecadação tributária recorde em todos os níveis, inexiste quem não sofra com a baixa qualidade dos serviços públicos em geral, não apenas daqueles remunerados indiretamente com o resultado de receitas fiscais, como também de outros tantos para os quais são agregadas taxas variadas. Questão de Estado? Absolutamente, não! Trata-se de questão de governo. A conclusão não é outra quando se avalia a condição das vias públicas destinadas ao trânsito de veículos e de pessoas. Nelas não ocorre simplesmente o que costumamos chamar de “acidentes”, fatos casuais, fortuitos e imprevistos. Pior que isso, grande parte das vias públicas brasileiras tem sido palco para prejuízos previsíveis, porém, em geral inevitáveis para quem tem o ônus de nelas trafegar. E a pergunta que todos fazem é sempre a mesma: a quem cabe reparar os danos decorrentes da má conservação dessas vias públicas? Juridicamente, a resposta é simples, pois a obrigação de indenizar os prejuízos causados ao particular recai sobre a pessoa jurídica que falhou no dever de conservação desses espaços. Nada obstante, é por acomodação ou descrença na velocidade de atuação do Poder Judiciário que muitos acabam suportando o prejuízo e não demandam a adequada indenização. No entanto, ao procederem desse modo, esquecem que as ações processuais indenizatórias funcionam como um “antídoto” bastante eficaz para a cura de certas “endemias” da administração pública. Se todos ainda não perceberam, com o advento da Lei de Responsabilidade Fiscal, um dos “princípios” que tem orientado as políticas de governo é o do “fluxo de caixa”, infelizmente sempre à frente dos imperativos da legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência e publicidade (CF, art. 37). No exato instante em que os administradores públicos observam o comprometimento significativo das receitas públicas com o resultado de indenizações judiciais, sintomaticamente altera-se a hierarquia das prioridades governamentais. Sem pretender profetizar, é o que parece irá ocorrer no Rio de Janeiro antes mesmo de ser controlada a epidemia que aflige a população daquele Estado, esquecida há décadas e vitimada pela incúria de sucessivos governos. Com as demandas judiciais que lá se acenam, provavelmente veremos um futuro parcialmente diferente se boa parte dessas vítimas exercer sua cidadania. Com efeito, sabe-se hoje que a responsabilidade que obriga o Poder Público a indenizar é de ordem objetiva (CF, art. 37, § 6º). Em outros termos, ela se define com a mera provocação do dano, sem a necessidade de investigar e provar a culpa do responsável. Quando muito, recorre-se ao método da “culpa presumida” pela omissão estatal em atenção ao grau de “defeituosidade” do serviço ou da prestação pública descumprida, o que torna relativamente confortável a posição do lesado no processo judicial. Quanto ao tempo de duração dos processos judiciais? Bem, esse ineliminável fator de angústia para os brasileiros é sensivelmente atenuado quando se considera que os juros judiciários, somados à correção monetária, hoje são superiores àqueles pagos por qualquer instituição financeira em suas captações no mercado! Enfim, se algo mais pode ser lembrado a título de conclusão, que seja o seguinte: o destino de um povo não se resolve apenas nas urnas, mas todos os dias com comportamentos concretos, afinal, mais vale um grama de ação do que uma tonelada de boas intenções.
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Este artigo foi publicado no jornal "Folha da Região" em 17.04.2008.

terça-feira, 15 de abril de 2008

O ANTEPROJETO DA NOVA LEI DE EXECUÇÃO FISCAL: O ABSOLUTISMO NÃO É COISA DO PASSADO

Foi concluído recentemente o anteprojeto da nova Lei de Execução Fiscal elaborado pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional. Sem dúvida, a principal inovação desse plano preliminar é aquela que permite aos Procuradores Fazendários efetivarem a penhora “on line” de dinheiro dos contribuintes em débito com o fisco, tudo sem processo ou ordem emanada de um Juiz de Direito. A redação do anteprojeto anterior possibilitava não só a penhora “on line” de valores depositados em instituições financeiras, como também não mencionava a necessidade da instauração sequencial do processo de execução fiscal contra o devedor. A redação atual mantém essa mesma permissão, mas condiciona a manutenção da penhora ao ulterior ajuizamento da ação de execução fiscal, como se inconstitucionalidades pretéritas fossem sanáveis ou perdoáveis! O que mais nos atormenta nesse anteprojeto é o atrevimento da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional contra a inteligência média do povo, além do desrespeito sem pudor à própria Constituição Federal, segundo a qual “ninguém será privado da sua liberdade e dos seus bens sem o devido processo legal” (art. 5º, XXXV). Ora, para assegurar os créditos fiscais em estado de perigo, foi editada a Lei 8397/1992, que regula a medida cautelar fiscal antecedente à execução e permite ao juiz ordenar o arresto de bens do contribuinte que ensejar risco de lesão grave e de difícil reparação à satisfação de ativos tributários. Vingando a iniciativa de Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, com ou sem fundado receio de prejuízo ao erário, realizar-se-á a penhora de valores sem o necessário controle prévio do Poder Judiciário. Tudo bem que, segundo os constitucionalistas, os princípios e regras embutidos na Constituição Federal não são absolutos, mas certamente eles não podem ser mitigados a ponto de permitir repristinar o absolutismo dos Estados Medievais, justificado por HOBBES em seu clássico “O Leviatã”. Na verdade, esse anteprojeto não objetiva apenas realizar o interesse público na máxima arrecadação possível. Ele também visa a “driblar” a pouca eficiência dos próprios Órgãos Fazendários, os quais, quase sem exceção, tardam sobremodo na formação definitiva dos créditos tributários e na promoção da ação de execução fiscal contra os contribuintes inadimplentes. Aliás, essa ineficiência é uma das grandes responsáveis pela perda de grande parcela da arrecadação fiscal, notadamente pelo transcurso do prazo da prescrição originária e da intercorrente (CTN, art. 174).

segunda-feira, 14 de abril de 2008

JULGAMENTO DA CAUSA MADURA PELO TRIBUNAL

Ao tratar do recuso de Apelação, o parágrafo 3º no artigo 515 do Código de Processo Civil estabelece que: “Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito (artigo 267), o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento.” Com essa previsão, a Lei dos Ritos permitiu ao tribunal julgar desde logo o mérito do processo quando prover a Apelação da sentença terminativa (art. 267), embora sem o antecedente pronunciamento meritório do juiz da causa. Em termos práticos, neste caso o mérito do processo só será decidido na segunda instância e em sede de Apelação, suprimindo o primeiro grau de jurisdição. A grande vantagem desse rito está no fato de que, reformada a sentença de extinção, o processo não precisará mais “baixar” à instância de origem para que o juiz da causa decida o mérito; o mérito será enfrentado desde logo pelo Tribunal em busca da máxima celeridade processual. Entretanto, o parágrafo 3º do artigo 515 impõe dois pressupostos para tanto: 1) que a causa verse questão exclusivamente de direito; 2) e que o processo esteja em condições de imediato julgamento. Quanto ao primeiro pressuposto, o parágrafo 3º comporta interpretação ampliativa porque a legislação disse menos do que deveria, afinal, mesmo que a causa verse questão de fato, se estes forem incontroversos, o Tribunal poderá julgar o mérito do processo desde logo. Finalmente, “estar em condições de imediato julgamento” significa que o processo deve haver observado plenamente o princípio do contraditório, a ampla defesa e que não sejam necessários novos debates para que o mérito seja decidido com segurança. Para essa previsão do parágrafo 3º a doutrina deu o nome de “julgamento da causa madura”, no sentido de o processo estar apto para a resolução do mérito pelo Tribunal de Apelação. Em nossa opinião, atento aos propósitos dessa regra processual, o Tribunal poderá julgar desde logo o mérito do processo ainda que não exista pedido expresso nesse sentido, ademais, o demandante que acessa o Poder Judiciário o faz para obter um pronunciamento de mérito em tempo razoável (art. 5º, LXXVIII).
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1. MACIEL, Daniel Baggio. Julgamento da causa madura pelo tribunal. Araçatuba: Página eletrônica Isto é Direito. Abril de 2008.

domingo, 13 de abril de 2008

SAIBA MAIS SOBRE A JUSTIÇA RESTAURATIVA

"Na Justiça Restaurativa, o tema central é o prejudicado pela infração penal, não o culpado. Ao contrário da Justiça Institucional, que se ocupa predominantemente com a violação à norma de conduta, a Justiça Restaurativa ocupa-se das consequências e dos danos produzidos pela infração. A Justiça Restaurativa valoriza a autonomia dos sujeitos e o diálogo entre eles, criando espaços protegidos para a auto-expressão de cada um dos envolvidos no delito, bem como daqueles interessados em contribuir para a solução do problema (transgressor, vítima, familiares, comunidades). Partindo daí, busca fortalecer e motivar as pessoas para que construam estratégias de restauração dos laços sociais rompidos pela infração penal. Ela enfatiza o reconhecimento e a reparação das conseqüências do delito, humanizando e trazendo para o campo da afetividade as relações atingidas pela infração, de forma a gerar maior coesão social na resolução do problema e compromissos efetivos na responsabilização do infrator, bem como no seu projeto de ajustar-se socialmente no futuro. Como na Justiça Restaurativa o foco principal são as consequências da infração, é a vítima que assume um papel de destaque, embora exista o respeito à dignidade do infrator enquanto pessoa. Além disso, ela objetiva a participação da comunidade e procura mobilizar o máximo de pessoas ligadas às partes envolvidas no conflito ou que possam contribuir para a solução do problema, abrindo espaço à participação de familiares, amigos ou pessoas próximas ao infrator e à vítima, bem como de representantes da comunidade atingida pelas consequências do ilícito. A ética restaurativa é de inclusão e de responsabilidade social, e visa a estimular os indivíduos para que assumam o papel de pacificar seus próprios conflitos, interrompendo as cadeias de reincidência da violência."
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Outras pesquisas sobre a Justiça Restaurativa podem ser feitas com qualidade na página da "Justiça do Século XXI".

sexta-feira, 11 de abril de 2008

A INDENIZAÇÃO DO DANO MORAL E OS "EXEMPLARY DAMAGES"

A compensação do dano moral ainda é tema bastante controvertido conforme assinala STOCO. Um dos motivos que induz ao debate acirrado sobre o assunto é a dificuldade de dosar as indenizações em casos tais, porque aqui não há como reconduzir a vítima ao estado anterior de coisas mediante o pagamento de uma determinada soma em dinheiro. Pela via da indenização monetária objetiva-se apenas atenuar as consequências psicológicas amargadas pelo lesado, sem, contudo, restaurar completamente a mesma situação de ânimo na qual ele se encontrava antes da lesão. Daí decorre inevitavelmente a seguinte pergunta: qual valor é suficiente e eficaz para tanto? Quando se cuida de indenizar esta espécie de dano, o julgador ingressa em um terreno de difícil trânsito porque o efeito moral da lesão normalmente é de difícil avaliação e oscila em cada caso conforme as suas circunstâncias. Esta é a razão da existência de decisões judiciais aparentemente contrastantes em casos que guardam semelhanças, mas que expressam, na verdade, que a quantificação do dano moral não pode ficar reclusa a balizas pouco flexíveis impostas pela lei. A indenização do dano moral, como se tem sustentado com acerto, tem caráter dúplice, isto é, compensatório e punitivo. Compensatório porque tem o propósito de abrandar as consequências psíquicas causadas pela lesão, possibilitando que a vítima tenha acesso a determinados bens da vida que lhe tragam satisfação íntima mediante o uso da quantia recebida no processo judicial, a qual, contudo, não pode ser fonte de enriquecimento ilícito (novo CC, art. 884). Punitivo porque a quantia arbitrada deve ter um efeito aflitivo sobre o ofensor a fim de sancioná-lo pelo dano causado. Do mesmo modo, fixando-se a indenização que implique a prudente diminuição do patrimônio do agente, procura-se também desestimular a recidiva. Isso não significa, entretanto, que se deva exorbitar a punição do agente, a ponto de identificá-la com os padrões norte-americanos dos “exemplary” ou “punitive damages”, os quais elevam sobremodo o valor da indenização (teoria inibitória). Atento à natureza dúplice da indenização, o magistrado deve seguir as demais orientações fornecidas pela doutrina, grande parte delas elencadas por DINIZ (2002) para obter homogeneidade na avaliação do dano moral.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
1. MACIEL, Daniel Baggio. Responsabilidade Patrimonial do Estado pela Atividade Jurisdicional. Birigui: Editora Boreal, 2006.
2. STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

VOCÊ JÁ OUVIU DIZER SOBRE OS CONTRATOS DE NAMORO?

Parece, mas não é boato. Com o advento da Constituição Federal de 1988, houve o reconhecimento da união estável como entidade familiar e, desde então, sabe-se que essa espécie de relação surge com a convivência pública, duradoura e contínua entre homem e mulher, com o objetivo de constituir família. Dela decorrem vários direitos e deveres para os conviventes, a exemplo da lealdade, do respeito e consideração mútuos e da assistência material e moral. Em geral, as uniões estáveis também produzem uma espécie de sociedade patrimonial entre os companheiros e lhes defere o direito à meação dos bens adquiridos onerosamente na constância da relação, salvo estipulações convencionais expressas em sentido diverso. Pois bem, com a regulação dessas entidades familiares e a publicidade distorcida que se deu ao assunto, muitos namorados passaram a se preocupar com o tema (ao nosso ver, sem razão), notadamente aqueles que já estavam se firmando na carreira profissional e mantinham relacionamentos considerados "avançados". Foi justamente nesse cenário que alguns jovens recorreram a determinados escritórios de advocacia em busca de orientações sobre o assunto e de algum instrumento contratual que lhes preservasse o patrimônio. Inadvertidamente, uns poucos profissionais criaram, então, o que popularmente se chama de "contrato de namoro", nos quais os apaixonados reconhecem textualmente a inexistência da união estável para tentar evitar problemas que possam surgir com o rompimento da relação. Nada obstante, qualquer pessoa menos esclarecida sabe que o simples fato de um contrato expressar esse conteúdo não significa, necessariamente, que ele é verdadeiro e que, ademais, as relações humanas podem se transformar com o tempo. Portanto, de nada vale um instrumento particular registrando a inexistência da união estável quando os requisitos de constituição dessa relação estiverem presentes. E isso, por si só, torna absolutamente desaconselhável pactuar contratos dessa natureza. Definitivamente, por mais evoluído que seja um namoro, ele não se confunde com o instituto da união estável. Nela os conviventes se comportam íntima e publicamente como se casados fossem, isto é, com o que se chama de "affectio maritalis", trazendo sempre presente a constituição da família integrada por ambos, nunca como um fim remoto ou distante a ser alcançado no futuro. Particularmente, não só desacreditamos nos chamados contratos de namoro como também imaginamos ser no mínimo cômico receber um convite para comparecer a um escritório de advocacia a fim de celebrar um pacto dessa espécie.
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Nota de atualização: atualmente, é igualmente reconhecida a união estável entre pessoas do mesmo sexo, o que se convencionou chamar de união homoafetiva.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

COMO RESCINDIR A SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA NO PROCESSO CIVIL

No processo civil, são muito comuns as sentenças ditas “homologatórias”. Em geral, elas são proferidas nos procedimentos de jurisdição voluntária regulados no Título II do Livro IV do Código de Processo Civil. Entretanto, não raras são as “sentenças homologatórias de transações” firmadas em procedimentos contenciosos, comuns ou especiais. Considerando a multiplicidade das sentenças homologatórias no direito brasileiro, com freqüência surgem dúvidas a respeito da ação processual adequada para rescindi-las caso ocorra o trânsito em julgado. Como já tivemos oportunidade de lembrar, essa dúvida é nutrida pelo próprio sistema processual porque, de um lado, o artigo 486 do Código estabelece que os “atos judiciais que não dependem de sentença, ou em que esta for meramente homologatória, podem ser rescindidos como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil”, o que torna cabível a “ação de anulação de sentença”. Porém, de outra banda, o artigo 485 da Lei dos Ritos estabelece que a sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando houver fundamento para invalidar a transação (VIII), o que permite o manejo da ação rescisória. Com a devida vênia daqueles que entendem o contrário, pensamos que as sentenças meramente homologatórias que ficam sujeitas à ação de anulação (art. 486) são apenas aquelas proferidas em “procedimentos de jurisdição voluntária”. Destarte, se a sentença homologatória de transação for emitida em “procedimento contencioso”, a via processual adequada para dissolvê-la é a ação rescisória (art. 485). Felizmente, não somos os únicos adeptos deste posicionamento. No mesmo sentido estão as lições de NELSON ALTEMANI, GALENO LACERDA e THEODORO JÚNIOR, para os quais a expressão “sentença meramente homologatória” inserida no artigo 486 refere-se apenas às decisões finais emitidas em “procedimentos de jurisdição voluntária”, as únicas suscetíveis de ação de anulação. Enfim, se a sentença homologatória for proferida em procedimento de jurisdição contenciosa do qual resultou transação, a ação processual adequada para dissolvê-la é mesmo a rescisória (CPC, art. 485, VIII).
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1. MACIEL, Daniel Baggio. Como rescindir a sentença homologatória no processo civil. Araçatuba: Página eletrônica Isto é Direito. Abril de 2008.

terça-feira, 8 de abril de 2008

AÇÃO, PROCESSO, PROCEDIMENTO E MEDIDAS CAUTELARES: UMA HABITUAL CONFUSÃO A SER DESFEITA

Na legislação e no meio forense são recorrentes as expressões “ação cautelar”, “processo cautelar”, “procedimento cautelar” e “medida cautelar”. Apesar dessas expressões possuírem significados diferentes, não são raras as vezes em que nos deparamos com o emprego impróprio delas por alguns profissionais que as confundem como se sinônimas fossem. Aliás, nem mesmo o legislador escapou a certas imprecisões terminológicas quando regulou o processo cautelar. Assim o artigo 796, que fala sobre a possibilidade de ser instaurado o procedimento cautelar antes ou no curso do processo principal. Em lugar de “procedimento cautelar”, melhor seria haver mencionado “processo cautelar”. Embora criticável, a utilização da expressão “procedimento cautelar” no artigo 796 é explicada por uma corrente doutrinária defendida por GALENO LACERDA, para quem o legislador tratou a demanda cautelar não como uma “ação judicial propriamente dita”, que só existiria se houvesse uma lide a ser definitivamente resolvida por sentença. Por isso, o Código preferiu falar em “procedimento cautelar”. Não é por outra razão que a Lei dos Ritos insistiu em designar preconceituosamente os sujeitos do processo cautelar de “requerente” e “requerido”, não de “autor” e “réu” como fez quando disciplinou o processo de conhecimento, inadvertidamente supondo não haver mérito na ação cautelar. No entanto, como assevera OVÍDIO BAPTISTA, “essa bizarra conclusão, como anteriormente mostramos, deve ser terminantemente repelida. A ação cautelar, tanto do ponto de vista da ação processual, enquanto pedido de tutela, é verdadeira ação, assim como também o é no plano do direito material. A superada idéia ainda reproduzida por Theodoro Júnior (Comentários, nº 55), das ‘ações meras’ de que fizeram praça todos os concretistas, confessos ou disfarçados, deve ser definitivamente sepultada. Por que a ação cautelar seria simplesmente uma ‘mera ação’? Ora, faz quase um século que se sabe que a ação processual existe mesmo que não exista nenhum direito material da parte!” Assentados esses aspectos, passamos à conceituação de cada uma dessas expressões. Entende-se por “ação cautelar” o meio pelo qual se manifesta a pretensão jurídica do interessado, dirigida ao Estado, para que preste a jurisdição e outorgue alguma providência de mera segurança do direito ameaçado de dano. É a exteriorização do direito público, constitucional, subjetivo, autônomo e abstrato de postular no judiciário a concessão de alguma medida cautelar. Portanto, a ação cautelar que é exercitável pelo interessado, intentada, ajuizada ou promovida. O “processo cautelar’ é o instrumento abstrato criado pelo Estado mediante lei e posto à disposição dos jurisdicionados para a obtenção de medidas cautelares. Trata-se de uma relação jurídica instaurada a partir do exercício da ação cautelar tendente ao exame sumário do direito alegado e da ameaça de dano que o aflige, bem como ao deferimento de providências assecuratórias pelo juiz. Com essa definição, fica claro que não se pode confundir “processo cautelar” com “autos do processo cautelar”, expressão esta reservada para designar o instrumento de documentação dos atos do processo, historicamente reproduzidos em papel, mas que também comporta outras formas de armazenamento, a exemplo do meio eletrônico. Por sua vez, “procedimento cautelar” é a forma legal pela qual os vários atos do processo cautelar são praticados e como eles estão concatenados ao longo da trajetória forense. Enfim, é o modo do processo cautelar se realizar no judiciário segundo os ditames da lei processual. Finalmente, “medida cautelar” é a tutela passível de concessão pelo juiz para a segurança temporária do direito ameaçado de lesão grave e de difícil reparação, e sem a qual provavelmente ele pereceria em maior ou menor tempo, conforme a iminência do dano. Em outros termos, é a providência meramente protetiva, temporária e não satisfativa outorgada pelo magistrado devido à probabilidade de existência do direito afirmado pelo requerente e do fundado temor de dano.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
1. MACIEL, Daniel Baggio. Processo Cautelar. São Paulo: Editora Boreal, 2012.
2. LACERDA, Galeno. Comentário ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Editora Forense, 1998.
3. SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Do Processo Cautelar. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2001.

A DIFERENÇA DA LEGITIMAÇÃO EXTRAORDINÁRIA PARA O INSTITUTO DA REPRESENTAÇÃO

Excepcionalmente, o ordenamento jurídico defere a alguns sujeitos a legitimação para que se apresentem em juízo pretendendo ou defendendo direito alheio em nome próprio, operando uma verdadeira substituição da parte no processo. Nesses casos, quem estará em juízo litigando não é aquele que afirma ser titular do direito lesado ou ameaçado de lesão, mas sim alguém em seu lugar. Fala-se na “substituição processual” ou “legitimação extraordinária”, que indica a participação de alguém no processo, na qualidade de parte, sem que seja o titular do direito pretendido ou disputado. Exemplo clássico de legitimação extraordinária é o do Ministério Público que ajuíza ação de investigação de paternidade fundada no artigo 2º da Lei 8.560/1.992 em benefício do menor desassistido e cujo pai se recusa ao reconhecimento voluntário. Entretanto, não se pode confundir a legitimação extraordinária com o instituto da “representação”. Na legitimação extraordinária, alguém que não é titular do direito passa a defendê-lo em nome próprio e se torna parte no processo. Na "representação", sem se tornar parte no processo, alguém que não é o titular do direito comparece em juízo para suprir a incapacidade daquele que afirma ser. É o que ocorre na ação de investigação de paternidade ajuizada pelo recém-nascido, representado por sua genitora. Neste caso, é o menor quem figura como parte no processo, não a representante, que apenas comparece em juízo para possibilitar o exercício do direito do filho ao reconhecimento da paternidade, justamente em razão da incapacidade do menor.
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1. MACIEL, Daniel Baggio. A diferença da legitimação extraordinária para o instituto da representação. Araçatuba: Página eletrônica  Isto é Direito. Abril de 2008.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

OS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS E A PRESCINDIBILIDADE DO ADVOGADO

O artigo 9º da Lei 9099/1995 tornou facultativa a assistência de advogado para as partes que demandarem ou serem demandadas nos Juizados Especiais Cíveis quando a causa não ultrapassar o valor de 20 salários mínimos. Entretanto, nas causas cujo valor for superior a esse patamar, a assistência de um profissional da advocacia é obrigatória. Nas causas em que essa assistência é opcional, se uma das partes comparecer assistida por advogado, ou se o réu for pessoa jurídica ou firma individual, terá a outra parte, se quiser, assistência jurídica prestada por órgão instituído junto ao Juizado Especial, na forma da lei local. Além disso, quando a causa recomendar, o juiz tem o dever legal de alertar as partes sobre a conveniência do patrocínio por advogado. Portanto, é fácil ver que esse dispositivo legal criou uma verdadeira exceção à capacidade postulatória atribuída aos advogados, o que possibilita às partes litigarem sozinhas nas causas de menor valor econômico que se desenvolverem nos Juizados Especiais. Embora amplamente criticado, esse dispositivo legal foi mais modesto que o artigo 791 da Consolidação das Leis do Trabalho, que assegura aos empregados e empregadores o direito de reclamar perante a Justiça do Trabalho sem a representação de advogado, independentemente do valor em jogo. Após mais de dez anos da vigência da Lei 9099/1995, parece que desapareceram todas as inquietações que outrora afligiram a classe dos advogados em razão do mencionado artigo 9º, afinal, sabe-se hoje que são raras as pessoas que se aventuram em litígios judiciais sem a assistência de profissional habilitado.
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1. MACIEL, Daniel Baggio. Os Juizados Especiais e a prescindibilidade do advogado. Araçatuba: Página eletrônica Isto é Direito. Abril de 2008.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

SÚMULA OBSTATIVA DE RECURSO

O "caput" do artigo 518 do Código de Processo Civil regula o ato processual mediante o qual o juiz admite a apelação interposta, declara os efeitos em que a recebe e determina a intimação do recorrido para respondê-la. Todos sabem que esse ato judicial é "complexo", pois ele abrange vários comandos com naturezas e conteúdos diferentes. O recebimento da apelação e a intimação do recorrido configuram meros despachos dos quais não cabe recurso algum (art. 504). Distintamente, a declaração dos efeitos da apelação (art. 520) caracteriza decisão interlocutória passível de agravo de instrumento (art. 522). Por força da 11279/2006, foi acrescentado o parágrafo 1º no artigo 518 para dizer que "o juiz não receberá a apelação interposta quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal". Com essa redação, o parágrafo 1º do artigo 518 criou uma espécie de "pressuposto recursal negativo", pois a apelação só será recebida pelo juiz se a sentença não estiver de acordo com súmula do STJ ou do STF. Aliás, a súmula a que se refere este dispositivo legal sequer precisa ser vinculante. Basta que seja uma súmula de mera orientação (súmula tradicional). No entanto, se o juiz aplicar o disposto no parágrafo 1º, estará proferindo uma decisão interlocutória pós-sentença, o que torna o ato judicial agravável por instrumento no prazo de 10 dias (art. 522). Como facilmente se percebe, o dispositivo processual comentado faz parte de um grupo de modificações realizadas no Código de Processo Civil para atender ao princípio da razoável duração do processo judicial, introduzido no artigo 5º da Constituição Federal pela Emenda Constitucional 45/2004 (inc. LXXVIII).
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1. MACIEL, Daniel Baggio. Súmula obstativa de recurso. Araçatuba: Página eletrônica Isto é Direito. Abril de 2008.