domingo, 4 de agosto de 2013

RECURSO INOMINADO

Nos Juizados Especiais Cíveis disciplinados pela Lei 9.099/95, a sentença não desafia apelação, mas "recurso" a ser decidido com sucinta fundamentação por uma turma ou colégio recursal integrado por magistrados que atuam no primeiro grau de jurisdição (arts. 41, 42 e 43). É por essa razão que o processo não alcança o tribunal e é revisado no ambiente do próprio Juizado Especial. Excetuadas as diferenças procedimentais, esse recurso se assemelha à apelação prevista no Código de Processo Civil, porquanto o manejo dele volta-se à revisão das sentenças que resolvem ou não o mérito do processo. É justamente a vocação legal desse recurso que induziu alguns escritores a ponderarem que ele poderia ter recebido o nome de “apelação", apenas com a ressalva de endereçamento ao órgão recursal do próprio Juizado. Todavia, a desnecessidade de atribuir-lhe uma nomenclatura específica resultou da circunstância de que, no sistema criado pela Lei 9.099/95, existe um único meio de impugnação das decisões judiciais, não uma variedade deles como ocorre no Código de Processo Civil, em que cada recurso recebeu um rótulo exclusivo e uma disciplina particularizada. Outra peculiaridade que caracteriza o recurso inominado é a de que o recebimento dele não impede o cumprimento imediato do julgado, exceto se o juiz atribuir-lhe efeito suspensivo para evitar dano irreparável à parte (art. 43). Esclarecidos esses aspectos, registre-se que o mencionado recurso deve ser interposto no prazo de dez dias a contar da intimação da sentença, em geral da própria audiência, pois é nela que o juiz deve proferir decisão sobre a lide, aplicando-se aqui a regra geral de contagem dos prazos processuais. Por isso, deve ser excluído o dia do começo e incluído o dia final do prazo recursal. A título de exemplo, se as partes forem intimadas da sentença em uma sexta-feira, o prazo recursal somente se iniciará segunda-feira, salvo se esta não for dia útil, caso em que ele começará a ser computado do primeiro dia útil seguinte. O preparo no recurso inominado deve ser recolhido e comprovado, independentemente de intimação, nas quarenta e oito horas seguintes à interposição, sob pena de deserção. Por simetria, o recorrido possui o prazo de dez dias para oferecer suas contrarrazões, prazo esse que é contado da intimação para tanto, iniciando no primeiro dia útil subsequente e computando o dia do fim. Não há na Lei 9.099/1.995 previsão normativa de recurso específico contra os pronunciamentos interlocutórios do juiz da causa. Apesar disso, algumas turmas recursais insistem em admitir o uso do agravo de instrumento para tanto, com o que não concordamos porque o microssistema recursal da referida lei não dialoga com o macrossistema que o Código de Processo Civil dedicou aos recursos que prevê. Ademais, a Súmula 376 do Superior Tribunal de Justiça já consagrou a orientação segundo a qual "compete à turma recursal processar e julgar o mandado de segurança contra ato de juizado especial", não obstante o Supremo Tribunal Federal tenha se manifestado, por maioria de votos, no sentido de que as decisões interlocutórias proferidas por esses juizados não toleram agravo de instrumento e, tampouco, mandado de segurança (RE 576.847-BA). Contra a decisão proferida no recurso inominado não cabe recurso especial porque o inciso III do artigo 105 da Constituição Federal exige que a decisão recorrida seja originária de tribunal e, como é sabido, as referidas turmas e colégios recursais não ostentam esse predicado. No entanto, o julgado emitido no recurso inominado pode ser impugnado mediante recurso extraordinário, a teor do inciso III do artigo 102 da Lei das Leis. Por fim, vale lembrar que as decisões monocráticas ou colegiadas dos Juizados Especiais também comportam embargos de declaração em cinco dias. Em virtude do princípio da celeridade, esses aclaratórios apenas suspendem o prazo de interposição do recurso inominado.
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NOTAS RELEVANTES:
1. O magistrado que proferiu sentença no Juizado Especial está impedido de funcionar no recurso inominado interposto contra ela.
2. O recurso inominado admite sustentação oral, contanto que realizada por advogado regularmente constituído.
3. Conforme os Enunciados 105 e 106 do FONAJE, aplica-se o artigo 475-J do Código de Processo Civil aos processos em curso pelos Juizados Especiais Cíveis, de modo que o decurso em branco do prazo de quinze dias para o devedor pagar a quantia certa fixada na sentença transitada em julgado atrai a incidência da multa de 10%.
4. A multa diária prevista nos incisos V e VI do artigo 52 da Lei 9.099/1.995 incide desde o descumprimento da decisão que deferiu a tutela antecipada.
5. Conforme Enunciado 81 do FONAJE, a arrematação e a adjudicação dos bens penhorados podem ser impugnadas, por simples pedido, no prazo de cinco dias do ato.
6. A alienação forçada dos bens penhorados (art. 52, VI) tem procedimento diferenciado das expropriações previstas no CPC. Neste último, necessário se faz o edital com oferta pública do bem penhorado para posterior arrematação. No sistema do Juizado, o juiz poderá autorizar o devedor, o credor ou terceira pessoa idônea a tratar da alienação extrajudicial do bem penhorado, a qual se aperfeiçoará em juízo até a data fixada para a praça (bens imóveis) ou leilão (bens móveis). Se o preço oferecido for inferior ao da avaliação, as partes deverão ser ouvidas.

7. Para manejar esse recurso, o recorrente deve construir duas petições. A primeira é de mera interposição e deve ser dirigida ao juiz causa, além de conter o número dos autos, bem como os nomes e a qualificação das partes. Em anexo, o peticionário deve compor o recurso propriamente dito, que será endereçado à turma ou colégio recursal e conter os fundamentos com os quais impugna a decisão hostilizada, bem como o pedido de reforma ou invalidação do julgado.
8. Conforme a Resolução 12/09 do STJ, quando a decisão de turma recursal do juizado especial estadual divergir da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, é cabível a reclamação para esse tribunal superior (CF, art. 105, inc. I, "f"), em quinze dias contados da publicação do acórdão que se quer reformar. Entretanto, a reclamação só terá cabimento quando a decisão impugnada contrariar enunciado de súmula ou decisão proferida no julgamento de recursos especiais repetitivos (CPC, art. 543-C).
9. Os doutrinadores THEODORO JÚNIOR e FREITAS CÂMARA defendem o cabimento do agravo de instrumento para a Turma Recursal contra decisão interlocutória que, no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, for capaz de causar lesão grave e de difícil reparação, tal qual reconheceu o Enunciado 2 do I Encontro do Primeiro Colégio Recursal dos Juizados Especiais Cíveis da Capital do Estado de São Paulo.
10. MACIEL, Daniel Baggio. Recurso Inominado. Página eletrônica Isto é Direito. Agosto de 2013.

44 comentários:

Evenia Rivera disse...

Maravilhosa página, me esclareceu. Obrigada.

Unknown disse...

Muito bom, parabéns!

vanessa disse...

Fantastico valeu por este blog.

Unknown disse...

Mas claro que isso, apenas água mineral, na fonte...

santos disse...


parabens,essa pagina e muito importante para ajudar os leigos como eu obrigada...



Anônimo disse...

Muito boa a explicação, não encontrava em nenhum livro, parabéns!!!!!! E muito obrigado!!!!!

suziane fontenelle disse...

Doutor, se possível gostaria que o senhor me esclarecesse uma dúvida: após a sentença do juiz singular e o recurso inominado ter sido recebido apenas no efeito devolutivo, pode ser iniciada a execução, mesmo que a obrigação seja de pagar quantia em dinheiro?

Anônimo disse...

Excelente o texto. Parabéns.
Porém, ainda tenho uma dúvida:

Homônimo que teve sua conta bancária bloqueada em razão de execução fiscal que tramitava, na __ª Vara Federal da Comarca X, e em razão desse bloqueio passou constrangimento ao pagar uma conta com o cartão de crédito que não foi aceito.
Nesse caso, pode o homônimo ingressar com uma ação no Juizado Especial Federal para requerer o desbloqueio da conta bancária e pleitear danos morais, ou deve se manifestar nos autos da própria execução que tramita na Vara Federal?

Daniel Baggio Maciel disse...

Doutora Susiane,
Sem dúvida. Se não for atribuído o efeito suspensivo ao recurso inominado, já é possível requerer a execução do julgado, mas lembro que ela será provisória.
Um abraço,
Prof. Daniel

Daniel Baggio Maciel disse...

Prezado Leitor (comentário acima),
Certamente, você pode manejar a ação indenizatória, em virtude do bloqueio indevido de aplicação financeira (homônimo). No entanto, penso que é caso de RESPONSABILIDADE DO ESTADO PELA ATIVIDADE JURISDICIONAL, razão pela qual deve ser demandado o Estado-membro, se a ordem emanou de juiz estadual, ou a União se o comando foi emitido por juiz federal. A propósito, o assunto está compreendido no nosso primeiro livro.
Um abraço,
Prof. Daniel

Unknown disse...

Prezado Professor. Após um ano e quatro meses de minha colação de grau, recorro ao seu blog com a finalidade de esclarecer dúvidas sobre recurso inominado. E como já esperado, estou satisfeita. Seus ensinamentos foram imensamente importantes e uteis em minha vida acadêmica, e como visto, continuam sendo em minha vida profissional. Só tenho que parabenizar e agradecer.

Antônio Max Rossendy disse...

Reitero os comentários dos colegas acima quanto ao esclarecedor texto.

Eis minha dúvida.
Dr. Como ficaria no cumprimento de sentença, sendo esta prolatada no Tribunal?
A partir de quando poderei executar? como farei?

Daniel Baggio Maciel disse...

Prezado Doutor Max Rossendy,
A propósito da sua pergunta, confira o artigo 475-P do Código de Processo Civil de 1973, segundo o qual: "O cumprimento da sentença efetuar-se-á perante: (Acrescentado pela L-011.232-2005)
I – os tribunais, nas causas de sua competência originária;
II – o juízo que processou a causa no primeiro grau de jurisdição;
III – o juízo cível competente, quando se tratar de sentença penal condenatória, de sentença arbitral ou de sentença estrangeira.
Parágrafo único. No caso do inciso II do caput deste artigo, o exequente poderá optar pelo juízo do local onde se encontram bens sujeitos à expropriação ou pelo do atual domicílio do executado, casos em que a remessa dos autos do processo será solicitada ao juízo de origem."
Um forte abraço,
Prof. Daniel

Jarbas disse...

Excelente artigo. Penso que só faltou mencionar sobre a possibilidade de reclamação ao STJ. Abraços

Daniel Baggio Maciel disse...

Estimado Doutor Jarbas,
No item "8" das notas de rodapé.
Um forte abraço e sucesso!
Prof. Daniel

Dr. Rubens M. Souza disse...

Ilustre Prof. Dr. Daniel.

Gostaria de fazer sustentação oral em Ação que, atualmente encontra-se no colégio recursal, fundamentando o art. 7º, IX do EAOB. Pergunta-se, existe uma ADI 1127 do STF sobre a inconstitucionalidade deste artigo. Existe outro meio de se fazer a sustentação oral. Grato - colega Rubens.

Dr. Rubens M. Souza disse...

Prof. Daniel, em sede de recurso inominado, foi declarada a inconstitucionalidade da sustentação oral (ADI 1127), existe outra fundamentação que não esta. Grato - Dr. Rubens

Daniel Baggio Maciel disse...

Estimado Doutor Rubens,
Peço vênia para me referir, em gênero, número e grau, aos comentários que li na página http://sustentacaooral.blogspot.com.br/2009/08/sustentacao-oral-nos-juizados-especiais.html.
Um forte abraço,
Prof. Daniel

FERNANDO CARVALHO MUNIZ disse...

Excelente explicação sobre o que é o Recurso Inominado. Muito útil ao meu aprendizado, além de ter sido explanado de forma bastante didática.
Parabéns!

Unknown disse...

Parabéns continue assim , Nos leigos no assunto precisamos de profissionais como o sr. com um português claro e de fácil entendimento. pois a complexidade dos processos é de difícil entendimento.
Obrigado vai me ajudar muito.

Boa sorte.
Maria Romilda Pascoski.

Unknown disse...

Boa tarde Doutor!
Após ter na esfera administrativa do inss ter um recurso provido pela caj/crps, anularam o acórdão e arquivaram o processo, por haver propositura judicial. Acontece que na esfera judicial meu processo foi para Turma recursal, recurso inominado impretado pelo inss contra decisão do JEF. Quais são as chances de obter êxito no julgamento?

Piter Monteiro disse...

Ótimo texto. Muitíssimo detalhado e rico. Parabéns!

Apenas resta uma dúvida. Sendo o reu condenado a pagar quantia certa e recorrendo. Vez q não pediu e não foi mencionado efeito suspensivo. Pode o autor executar e receber o valor dado em sentença? E se posteriormente a turma julgar procedente o pedido recursal diminuindo o valor da condenação?

Daniel Baggio Maciel disse...

Estimado Piter,
Sim, é possível a execução provisória da sentença emanada do juizado especial cível, nos termos dos artigos 475-I e 475-O do CPC, para a qual se exige caução idônea de indenizar a parte contrária dos prejuízos que ela sofrer. No entanto, lembro que o Enunciado 35 do FONAJEF veda a execução provisória nos processos de sua competência.
Atenciosamente,
Prof. Daniel

Daniel Baggio Maciel disse...

Estimado Gerson,
É difícil fazer qualquer prognóstico do tempo de tramitação do recurso inominado na turma recursal do JEF, especialmente porque não sei qual delas é competente para o vosso processo.
Atenciosamente,
Prof. Daniel

Anônimo disse...

Prezado Ms. Dr. Daniel., peço vênia para parafrasear um brilhante professor.
"Irretocável o seu texto".
Qual o seu entendimento para se manejar o mandado de instrumento, uma vez que não fora interposto o Recurso Inominado? Quais as hipóteses de cabimento ? E quando se tratar de questao de ordem publica, que pode ser alegada em qualquer fase do processo, haja vista nao caber Rescisoria no JEC ?

Daniel Baggio Maciel disse...

Caro Colega (comentário acima),
Conforme enfatizei nesse pequeno texto, penso que o microssistema recursal da Lei 9.099/95 não se comunica com o macrossistema recursal do CPC, razão pela qual entendo não ser possível o uso de agravo de instrumento no âmbito dos juizados especiais cíveis, embora reconheça a existência de entendimento diverso, conforme já manifestado no Enunciado nº 02 do I Encontro do Primeiro Colégio Recursal dos Juizados Especiais Cíveis da Capital do Estado de São Paulo: "É ADMISSÍVEL, NO CASO DE LESÃO GRAVE E DIFÍCIL REPARAÇÃO, O RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO NO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL". No mesmo sentido estão as lições de THEODORO JÚNIOR e de ALEXANDRE FREITAS CÂMARA.
Atenciosamente,
Prof. Daniel Baggio Maciel

Unknown disse...

Para quem atua fora da área como eu e se vê obrigada a se manifestar em processos que tramitam nos juizados especiais digo que esse Blog é fundamental para nos socorrer nos momentos mais difíceis. Obrigada!

Erivan Duda disse...

Parabéns Dr.Baggio, sua prestatividade enriquece a muitos desprovidos de informação na área jurídica.
Abraços,



Erivan Duda disse...

Parabéns Dr.Baggio, sua prestatividade enriquece a muitos desprovidos de informação na área jurídica.
Abraços,



Unknown disse...

Doutor. Boa noite. Tenho uma dúvida. O recurso inominado quando recebido em seu efeito suspensivo, suspende a multa diária por descumprimento de obrigação de fazer, ou esta pode ser ao final executada desde o seu arbitramento? Desde já agradeço.

Unknown disse...

Material de grande valia, espero que continue sempre com publicações deste nível, pois nos ajuda e muito. Obrigado.

Anônimo disse...

Muito obrigada pelo seu esclarecimento quanto ao recurso inominado. Sanou todas as minhas dúvidas. Meus parabéns por este trabalho. Suely Pinto

Anônimo disse...

Um dos comentários mais claros que já vi sobre o tema. Muito bom!

Unknown disse...

Boa noite ótimo mesmo sanou todas as minhas dúvidas
Sizenando Martins de Souza Neto

Raquel disse...

Prezado Dr. Baggio,

Ótimo texto e de grande valia para todos nós! Permita-me apenas esclarecer uma última dúvida: ao ser intimada para apresentar contrarrazões de recurso inominado interposto com pedido de efeito suspensivo, a parte obrigatoriamente no ato da intimação deve ser informada quanto à concessão ou não do efeito suspensivo pelo magistrado?

Abs,


Unknown disse...

O melhor até agora, sem sombra de dúvidas.
Esclarecimento.

KARLOS GARRIDO disse...

obrigado comentario muito bem formulado a esclarecedor de duvidas, principalmente as que tinha obg mesmo!!!

Anônimo disse...

Muito esclarecedor! Parabéns pela iniciativa, são poucos que, com o seu conhecimento e facilidade de elucidar o Direito, se predispõem em publicar conteúdos de tamanha importância, sobretudo pra quem está iniciando na advocacia.

Rogério Ferreira.

Liney Quevedo disse...

Parabéns ao excelente profissional que escreveu esta matéria....até eu que sou leiga nesse assunto, entendi muitíssimo bem as explicações.....Perfeito.

Tatiane costa disse...

Perfeito o texto, muito esclarecedor.Deu vontade de estudar Direito.

Islandia disse...

Excelente trabalho, sucinto e esclarecedor por demais, parabéns pela competência.

Islandia disse...

Excelente trabalho, sucinto e esclarecedor por demais, parabéns.

Altair Braga disse...

Muito esclarecedor!!! Parabéns!!!

Anônimo disse...

Professor, o senhor é extremamente esclarecedor! e Infinitamente úteis são as suas postagens para a execução da advocacia na prática! Parabéns para o melhor professor de Processo Civil da história da UniToledo.