sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

A INÉRCIA DA JURISDIÇÃO, O DISPOSITIVO E O IMPULSO OFICIAL NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

O artigo 2º do novo Código de Processo Civil prevê que o processo comece por iniciativa da parte e se desenvolva por impulso do juiz, salvo as exceções previstas em lei. Nesse dispositivo legal estão concatenados os princípios da ação, o dispositivo e o do impulso oficial, todos eles objeto deste artigo. O princípio da ação, também conhecido como princípio da demanda, está associado à necessidade de preservação da impartialidade do órgão judicial incumbido da prestação jurisdicional e da imparcialidade que deve caracterizar a atuação do magistrado nele investido. Em linhas gerais, ele veda a instauração dos processos judiciais sem que o legitimado ordinário ou extraordinário o faça mediante o ajuizamento da ação adequada. É assim porque o exercício indiscriminado da jurisdição de ofício implicaria o deslocamento do órgão judicial para a posição de parte na relação processual, fatalmente vincularia a atuação do respectivo magistrado ao sucesso da sua iniciativa e comprometeria, em igual escala, os predicados da segurança e da justiça que precisam frisar o processo legal para que ele seja considerado devido (CF, art. 5º, inc. LV). Portanto, aquele que pretender invocar a tutela jurisdicional do Estado deverá se valer da garantia fundamental localizada no inciso XXXV, do artigo 5º, da Constituição Federal e exercer a ação processual pertinente, quer para fins repressivos da violação a direito ou preventivos da ofensa a ele, mesmo porque a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Embora a inércia da jurisdição seja a regra, o próprio artigo 2º admite que o processo civil tenha início mediante determinação judicial, tal qual ocorre nos procedimentos especiais de arrecadação da herança jacente (art. 753 e seguintes) e de arrecadação dos bens dos ausentes (art. 759 e seguintes), cuja instauração deve ser ordenada pelo juiz, independentemente de requerimento. Porém, é necessário frisar que a formação do processo por iniciativa judicial é excepcional e, nessa qualidade, sempre fica na dependência de autorização legal. Por sua vez, o princípio do impulso oficial é aquele segundo o qual compete ao juiz, assim também ao tribunal, fazer com que o processo se desenvolva em atenção ao procedimento definido em lei e alcance seu termo em tempo razoável. Em outras palavras, ele incumbe os órgãos judiciais da realização de todas as condutas inerentes à jurisdição e da assunção de uma postura proativa, no sentido de instar a prática dos atos processuais que a lei confere às partes, impulsionando o processo segundo a ritualística legal e conservando-o apto para a tutela efetiva do direito versado no caso concreto. Não obstante pertença aos órgãos judiciais a incumbência de promover a tramitação dos processos, a garantia da dinâmica processual muitas vezes depende da cooperação das partes, a quem a legislação processual pode imputar determinados comportamentos, seguidos de consequências para a hipótese de descumprimento. Essas condutas processuais atreladas a repercussões negativas para a parte remissa são denominadas ônus processuais. A título de exemplo, o artigo 351 estabelece que se o réu não contestar a ação, ele será considerado revel e presumir-se-ão verdadeiras as alegações de fato formuladas pelo autor. Finalmente, a acepção clássica do princípio dispositivo confere às partes toda iniciativa relacionada à instauração e ao desenvolvimento do processo, o que inclui o poder para desistir da ação ajuizada, restringir a atuação judiciária segundo o pedido inicial, deixar de alegar fatos que possam prejudicá-las no julgamento deste, não produzir provas além daquelas que são do seu interesse, prerrogativas essas que limitam sobremodo o espaço dentro do qual o juiz pode se movimentar no processo, mas que se justificam facciosamente devido à necessidade de garantir a impartialidade com que os órgãos judiciais devem exercer suas funções, bem como a imparcialidade dos magistrados neles investidos. Antes mesmo da adoção do modelo social do processo, esse princípio já havia sofrido importantes mitigações porque a influência descalibrada dele sobre a legislação é capaz de enredar inúmeras situações de iniquidade na composição das lides submetidas ao Poder Judiciário, tanto assim que o citado artigo 2º reproduziu a fórmula encontrada no artigo 262 do Código de 1.973 e reservou ao juiz o poder para impulsionar o processo que já estiver instaurado, não obstante outorgue à parte o poder para promover-lhe o início. No tocante à atividade probatória, igual mitigação se encontra no artigo 377, pois cabe ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito, motivo pelo qual ele não fica adstrito àquelas indicadas pelos litigantes. Apesar das várias restrições que sofreu ao longo do tempo, o princípio dispositivo ainda está vigorosamente presente em muitas passagens do novo Código. A título de exemplo, o artigo 141 estabelece que o juiz decidirá o mérito do processo nos limites propostos pelas partes, sendo-lhe vedado conhecer de questões não suscitadas a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte. A presença desse princípio no artigo 502 também é visível, pois ele proíbe o juiz de proferir decisão de natureza diversa da pedida, assim também que condene a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.
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MACIEL, Daniel Baggio. A inércia da jurisdição, o dispositivo e o impulso oficial no novo Código de Processo Civil. Página eletrônica Isto é Direito. Janeiro de 2015.
NOTA RELEVANTE: Este artigo foi composto segundo os dispositivos constantes do projeto de lei que institui o novo Código de Processo Civil. 

Um comentário:

Anônimo disse...

Sou estudante de direito e gostei muito do blog, o conhecimento passado aqui é de suma importância para a minha formação e conhecimento. Porém, acredito que uma melhor formatação dos textos ficaria mais atraente e melhor para se ter uma boa leitura e até mesmo entendimento. Letras pequenas, linhas muito perto umas das outras e a falta de palavras destacadas, dificulta. Respeitosamente Gabriel Fonseca