O artigo 4º do novo CPC incorporou
a garantia da razoável duração do processo e dos meios que assegurem a
celeridade da sua tramitação, inserida no inciso LXXVIII do artigo 5º da
Constituição Federal pela Emenda Constitucional nº 45/2004, garantia essa que
gravita em torno das ações cognitivas, executivas e cautelares, bem como dos
processos delas originários. Deve ser assim porque o direito de ação não se resume à
prerrogativa de acesso à Justiça a todo aquele que afirmar lesão ou ameaça a
direito. Ele também encampa o direito dos jurisdicionados a um conjunto de
técnicas processuais capazes de viabilizar a obtenção tempestiva e eficaz das
tutelas compromissadas pelo sistema legal para os direitos em geral, sem que
haja o sacrifício da segurança jurídica que todos esperam encontrar no
processo. Em outras palavras, é preciso ter em mente que se a excessiva demora
na duração do processo é um problema que precisa ser erradicado para que se
alcance um padrão satisfatório de serviço judiciário no Brasil, a realização de
uma justiça indiscriminadamente veloz também é capaz de repercutir
negativamente na qualidade desse tipo de prestação estatal, mesmo porque uma
significativa parcela das demandas judiciais requer a investigação da verdade
dos fatos que lhes são subjacentes e, sabidamente, a descoberta dela nem sempre
é tarefa das mais ágeis. Portanto, o ideal é o balanceamento dos vetores da
celeridade e da segurança jurídica no processo, o que exige do legislador a
identificação das várias modalidades de ações compreendidas pelo ordenamento
legal e a disciplina dos respectivos procedimentos em consideração aos objetivos
de cada categoria processual, assim também às eventuais particularidades do
direito que se almeja tutelar. A título de exemplo, se o processo de execução tem
como pressupostos a liquidez, a certeza e a exigibilidade da obrigação
documentada no título executivo, não faz sentido dotá-lo de um procedimento
cuja dialeticidade e o contraditório sejam tão intensos como aqueles que
caracterizam o processo de conhecimento, que sempre se inicia com a incerteza
sobre qual das partes tem razão. É por essa razão que não se podem conceber
procedimentos executivos compostos por um número elevado de atos processuais ou
com prazos legais demasiadamente elásticos, pois a celeridade que deles se pode
exigir acabaria comprometida em nome de uma segurança jurídica que, em grande
parte, já é deferida pelo título que aparelha a execução. Do mesmo modo, também
não se pode admitir um procedimento de cognição exauriente tão simplificado e
veloz que ameace a descoberta da verdade dos fatos constitutivos, modificativos, impeditivos
ou extintivos do direito rivalizado pelas partes, o que aniquilaria a segurança
jurídica no processo, a pretexto da busca desenfreada pela celeridade. Para que
se estimule a celeridade processual, tão relevante quanto o equacionamento desses
vetores é que o legislador lance mão de mecanismos para combater abusos do
direito de defesa, comportamentos protelatórios empregados dentro ou fora do
processo e eventuais faltas funcionais do próprio magistrado, o que normalmente
se consegue com a imposição de sanções pecuniárias ao litigante de má-fé (arts.
82, 83, 84 e 122), mediante técnicas processuais de concessão de tutelas de
urgência e de evidência (arts. 269 a 278), assim também com a responsabilização
civil daquele agente público (art. 123, inc. II). Ademais, para que se respeite
a referida garantia constitucional, o legislador deve ter a perícia de perceber
que determinados direitos materiais, por sua própria índole, trazem ínsita a
necessidade de uma tutela jurisdicional diferenciada e, não raro, impassível de
aguardar a emissão de um pronunciamento judicial definitivo, independentemente
da ocorrência de qualquer circunstância episódica capaz de desencadear-lhe
lesão importante, o que recomenda a criação de procedimentos caracterizados por
um ou mais elementos especializantes, a exemplo da liminar nas ações
possessórias de força nova (art. 548). No tocante aos recursos, a preocupação
não pode ser menor, pois é vital que o legislador identifique quais deles são realmente
imprescindíveis para a concretização do paradigma de processo civil definido pela
Constituição Federal e elimine aqueles que se mostram supérfluos, o que
perpassa pela reavaliação das competências atribuídas
aos tribunais brasileiros. Sem pretender exaurir a receita de
um processo civil sinceramente compromissado com a razoável duração e que não
adstrinja a segurança jurídica que precisa caracterizá-lo, importante mesmo é ter a honestidade para reconhecer que a crise deflagradora da criação
do novo Código nunca esteve enraizada no estatuto de 1.973, mas sim nas
múltiplas insuficiências de infraestrutura e de administração do Poder
Judiciário, todas elas bradadas há décadas pelos profissionais que se ativam
junto dele. Daí porque preferimos falar em “crise judiciária”, não propriamente
em “crise do processo”, ao contrário do que muitos passaram a apregoar,
inadvertidamente. Seja como for, ao estabelecer que as partes têm o direito de
obter em prazo razoável a solução para a lide, inclusive a atividade
satisfativa, o artigo 4º do novo CPC impôs aos órgãos do Poder Judiciário o
dever de fornecer a prestação jurisdicional com a eficiência prometida pela Constituição
Federal (art. 5º, inc. LXXVIII) e possibilitada pela nova codificação, o que
implica para os juízes e tribunais um conjunto de atuações cotidianas voltadas
à concretização desse comando em todas as espécies de processo, qualquer que
seja o procedimento aplicável. Portanto,
a partir da vigência do novo estatuto processual, já não serão mais admissíveis escusas ordinárias
para o retardamento que passou a caracterizar os serviços forenses nas últimas décadas,
razão pela qual a inexecução da norma do no artigo 4º poderá acarretar a
responsabilidade patrimonial do Estado, nos moldes do § 6º do artigo 37 da
Constituição Federal, quando causar dano ao jurisdicionado em virtude de ato ou
omissão debitável a qualquer agente judiciário faltoso, inclusive aos
magistrados. Do mesmo modo, independentemente da existência de culpa, o Estado
também poderá ser responsabilizado patrimonialmente pelos danos que causar em decorrência
de falha anônima relacionada à impontualidade dos serviços forenses,
responsabilidade essa que, como já tivermos oportunidade de sustentar em obra
específica, é igualmente objetiva. Para atender ao disposto no artigo 4º e evitar
a responsabilidade estatal pela prestação jurisdicional anormal, juízes e
tribunais deverão corresponder a um conjunto de poderes-deveres que lhes foram
conferidos pela nova codificação, dentre os quais convém destacar os seguintes:
a) instar as partes e seus procuradores a contribuírem para a rápida solução da
lide e a colaborarem para a identificação das questões de fato e de direito, abstendo-se
de provocar incidentes desnecessários e procrastinatórios (art. 8º); b) limitar
o litisconsórcio facultativo quanto ao número de litigantes, na fase de
conhecimento ou na de execução, quando este comprometer a rápida solução do
litígio, dificultar a defesa ou o cumprimento da sentença (art. 112, § 1º); c) exigir
das partes e seus procuradores que procedam com lealdade no processo, aplicando
sanções pecuniárias ao jurisdicionado que proceder com improbidade (arts. 80 a
84); d) cobrar do escrivão, do oficial de justiça e dos demais auxiliares do
juízo o cumprimento tempestivo dos atos impostos por lei ou determinação
judicial (art. 134); e) exigir do perito a entrega do laudo no prazo que lhe
for assinado (arts. 136 e 450), substituindo-o quando assim não proceder sem
motivo legítimo (art. 448, inc. II); f) advertir os órgãos ou repartições
públicas incumbidas da prova pericial a que cumpram a determinação com
preferência, no prazo estabelecido, impondo multa inclusive a seus dirigentes
na hipótese de descumprimento desses deveres (art. 462, §§ 1º e 2º); g) só ampliar
os prazos dilatórios quando absolutamente necessário para conferir maior
efetividade à tutela do bem jurídico ou em consideração à complexidade da causa
(art. 118, inc. V e art. 185); h) promover o andamento célere do processo (art.
118, inc. I); j) tentar, prioritariamente e a qualquer tempo, compor
amigavelmente as partes (art. 118, inc. II); l) apenas deferir a convenção das
partes sobre a prorrogação de prazo dilatório quando fundada em motivo legítimo
(art. 189); m) somente prorrogar prazos peremptórios nas comarcas ou seções
judiciárias onde for difícil o transporte ou em caso de calamidade pública
(art. 190); n) não exceder os prazos que o Código estabelece, salvo por motivo
justificado (art. 195); o) proferir despachos de expediente em cinco dias,
sentenças em vinte dias e demais decisões em dez dias (art. 196); p) fiscalizar
a atividade do serventuário de remeter os autos conclusos em um dia e de executar
os atos processuais em cinco dias (art. 197), salvo no processo eletrônico, em
que a movimentação deverá ser imediata (§ 2º); q) instaurar contra o
serventuário procedimento administrativo quando exceder prazos sem motivo
legítimo (art. 200); r) determinar, de ofício, o desentranhamento de petições,
manifestações e documentos apresentados por advogados públicos ou privados,
defensor público ou membro do Ministério Público, quando qualquer um deles
exceder o prazo de restituição dos autos (art. 201); s) indeferir a convenção
das partes a respeito da suspensão do processo por período superior a seis
meses (art. 288, § 3º); t) cuidar para que o processo não permaneça suspenso
por mais de um ano, quando a sentença de mérito depender do julgamento de outra
causa ou da declaração da existência ou não da relação jurídica, que constitua
objeto principal de outro processo pendente; quando ela não puder ser proferida
senão depois de verificado determinado fato ou de produzia certa prova
requisitada por outro juízo; ou quando ela tiver como pressuposto o julgamento
de questão de estado, requerido como declaração incidente (art. 288, § 4º); u) no
tribunal, vistar os autos no prazo máximo de dez dias e restituí-los prontamente
para a reinclusão na pauta de julgamento na sessão seguinte à devolução (art.
895); v) promover a publicação do acórdão dentro de um mês contado da data da
sessão de julgamento (art. 897, § 3º). Dentre os dispositivos do novo Código que estimulam
a razoável duração do processo, é importante realçar o artigo 204, que
possibilita a qualquer das partes, ao Ministério Público e à Defensoria Pública
representar ao presidente do tribunal contra o magistrado que excedeu o prazo
previsto em lei, iniciativa essa que dará origem a um procedimento para
apuração da responsabilidade disciplinar desse agente público e autoriza aquele
órgão superior, conforme as circunstâncias, avocar os autos em que ocorreu o
excesso, remetendo-os ao substituto legal do magistrado faltoso, sem prejuízo
das providências administrativas (§§ 1º e 2º). Independentemente da
instauração desse procedimento disciplinar, o artigo 123 prevê que o magistrado
poderá ser responsabilizado pessoal e patrimonialmente pelos danos que causar
quando, no exercício de suas funções, proceder com dolo ou fraude, bem como nas
hipóteses de recusa, omissão ou retardamento, sem justo motivo, de providência
que deva ordenar de ofício ou a requerimento. Contudo, nessas últimas três
situações, o parágrafo único do mencionado artigo condiciona a responsabilidade
civil do magistrado à falta de apreciação, em dez dias, da providência requerida pela parte e que foi objeto da recusa, omissão ou retardamento
judicial, sem justo motivo.
___________________
1. MACIEL, Daniel Baggio. A razoável duração do processo e o novo Código de Processo Civil. Araçatuba: Página eletrônica Isto é Direito. Dezembro de 2013.
2. Nota: Este artigo foi produzido a partir do projeto do novo Código de Processo Civil e considerou as alterações apresentadas no relatório geral do senador Valter Pereira.
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1. MACIEL, Daniel Baggio. A razoável duração do processo e o novo Código de Processo Civil. Araçatuba: Página eletrônica Isto é Direito. Dezembro de 2013.
2. Nota: Este artigo foi produzido a partir do projeto do novo Código de Processo Civil e considerou as alterações apresentadas no relatório geral do senador Valter Pereira.
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