segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

A LEGITIMAÇÃO RECURSAL NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Possuem legitimação recursal os sujeitos que estão legalmente autorizados a recorrer dos pronunciamentos jurisdicionais, assim a parte vencida, o Ministério Público e o terceiro prejudicado, conforme proclamado pelo artigo 996. No entanto, importa observar que o fato de a parte ser vencida não se relaciona propriamente com a legitimação para interpor recurso, mas sim com o interesse que justifica a utilização desse meio de impugnação de decisões judiciais, razão pela qual o mencionado dispositivo legal poderia haver renunciado a essa adjetivação, que também estava presente no Código de 1.973 (art. 499). Ademais, nem sempre a sucumbência é um componente indispensável para que a parte possa recorrer. Prova disso é que os embargos de declaração podem ser opostos não só pela parte vencida, mas também por aquela que sair vitoriosa na decisão, afinal, não é a sucumbência que possibilita o uso dessa espécie recursal, mas sim a obscuridade, a contradição, a omissão ou o erro material apontado pelo recorrente no ato decisório (art. 1.022). Além dessa ressalva, é preciso assinalar que há casos em que o fundamento invocado no julgado pode causar algum prejuízo à parte vencedora, o que oportuniza a utilização do recurso com o objetivo de afastá-lo, não obstante o resultado favorável por ela alcançado no pronunciamento jurisdicional. Exemplo clássico dessa situação é a sentença que rejeita a alegação de pagamento nos embargos do devedor, mas que os acolhe para declarar a prescrição da pretensão executiva, o que permite ao embargado retornar a juízo, mediante sucessiva ação de conhecimento, para tentar constituir um título executivo judicial que reconheça a obrigação da qual afirma ser credor. Nesta hipótese, embora vencedor na sentença, o embargante poderá manejar a apelação para insistir na tese do pagamento, pois a declaração judicial dele inviabiliza o posterior ajuizamento da ação cognitiva. O mesmo ocorre com a sentença que julgar improcedente, por falta de provas, o pedido formulado em ação coletiva, pois esse resultado não obsta a repropositura da demanda, contanto que ela venha apoiada em nova prova (CDC, art. 103). Portanto, apesar de vencedor, o réu da ação coletiva poderá apelar da referida decisão para postular o reconhecimento da suficiência das provas produzidas e, desse modo, tentar evitar o ajuizamento de uma nova ação. Feitas essas considerações, é preciso acrescentar que o conceito de parte compreende, além do autor e do réu, o litisconsorte (art. 113), o assistente litisconsorcial (art. 124), o litisdenunciado (art. 125), o chamado ao processo (art. 130) e o opoente (art. 682). Portanto, todos esses sujeitos estão autorizados a recorrer das decisões judiciais, sempre que presente o interesse no uso desse remédio processual. Diferentemente do assistente litisconsorcial, o assistente simples não se torna parte na relação processual em que for admitida sua intervenção e só pode recorrer se o assistido não se opuser. Deve ser assim porque a atuação do assistente simples é coadjuvante e fica subordinada à atividade do assistido, exceto se este for revel ou omisso de qualquer outro modo, caso em que o assistente será considerado seu substituto processual (art. 121, parágrafo único). O Ministério Público possui legitimação recursal quando atuar como parte e nas causas em que funcionar como fiscal da ordem jurídica. Logo, seja como órgão agente, parte passiva ou interveniente, a legislação faculta a interposição do recurso por essa instituição. Embora normalmente se apresente como autor de um expressivo número de ações civis, nada impede que o Ministério Público figure no pólo passivo de algumas delas, não para a sua responsabilização por eventuais prejuízos causados a terceiros, mas sim quando a lei deferir-lhe capacidade postulatória para responder ao pedido do autor. É o que acontece, por exemplo, nas ações rescisórias propostas para desconstituir a coisa julgada material formada em ações civis ajuizadas pela instituição, bem como nos embargos do devedor e nos embargos de terceiro apresentados em face de execução de título extrajudicial intentada pelo parquet. Além dessas situações, o Ministério Público também pode ocupar a posição de demandado quando a legislação atribuir-lhe legitimação extraordinária para defender, em nome próprio, direito de terceiro, tal qual ocorre na ação declaratória de nulidade de compromisso de ajustamento de conduta tomado pela instituição e na ação de anulação dessa modalidade de ato administrativo negocial (Lei nº 7.347/1.985, art. 5º, § 6º). Como fiscal da ordem jurídica, o Ministério Público deve ser intimado para intervir nas causas que envolvam interesse público ou social, interesse de incapaz, litígios coletivos pela posse de terra rural ou urbana, sem excluir as demais situações previstas em lei ou na Constituição Federal (art. 178), mas vale lembrar que a participação da Fazenda Pública no processo não configura, por si só, hipótese de intervenção dele. Nos casos em que o Ministério Público funcionar como custos legis, seja em razão da natureza da lide ou da qualidade de parte, ele terá vista dos autos depois das partes, será intimado de todos os atos do processo, poderá produzir provas e requerer medidas processuais pertinentes, além de recorrer (art. 179). Porém, superada a causa que determinou sua intervenção no processo civil, cessa a respectiva legitimação recursal. Finalmente, entende-se por terceiro todo aquele que não figura como parte no processo por ocasião da publicação da decisão judicial contra a qual pretende se insurgir, seja porque nunca compareceu nessa qualidade ou porque deixou de titularizá-la em momento anterior àquele. Entretanto, não é qualquer terceiro que possui legitimação para interpor recurso, senão apenas aquele que demonstrar a possibilidade de a decisão sobre a relação jurídica submetida à apreciação judicial atingir direito do qual afirme ser titular ou que possa discutir em juízo como substituto processual (art. 996, parágrafo único). Portanto, além das hipóteses em que o terceiro está autorizado pelo ordenamento jurídico a defender direito alheio em nome próprio (art. 18, parágrafo único e art. 109), ele somente possui legitimação recursal nos processos em que poderia haver figurado como assistente simples (art. 121) ou como assistente litisconsorcial (art. 124), por manter uma relação jurídica com a parte que poderia ser sua assistida ou com o adversário dela, respectivamente. No mais, resta acrescentar que o magistrado só pode interpor recurso contra a decisão com a qual o tribunal acolher a alegação de impedimento ou suspeição (art. 146, § 5º), assim também contra o julgado que desprovê-lo, ao passo que o amicus curiae apenas está legitimado a opor embargos de declaração (art. 138, § 1º), a recorrer da decisão que julgar o incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 138, § 3º) e a agravar por instrumento do pronunciamento interlocutório que não admitir sua intervenção no processo (art. 1.015, inc. IX).
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MACIEL, Daniel Baggio. A legitimação recursal no novo Código de Processo Civil. Página eletrônica Isto é Direito. Fevereiro de 2015.
 
NOTA RELEVANTE: Este artigo foi composto segundo os dispositivos constantes do projeto de lei que institui o novo Código de Processo Civil.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

A ADEQUAÇÃO DOS RECURSOS NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Como demonstrado em artigo acadêmico publicado anteriormente, não são todos os pronunciamentos judiciais que podem ser atacados mediante recurso, senão aqueles com conteúdo decisório, nos quais se incluem as sentenças, as decisões interlocutórias, os acórdãos e as decisões unipessoais do relator, sejam elas intermediárias ou finais. Ademais, como realçado durante o estudo do princípio da taxatividade, os recursos existem em número fechado no nosso ordenamento jurídico, o que impede a criação de outras modalidades recursais segundo a vontade daqueles que estão autorizados a usá-los. Diante disso, é fácil perceber que a admissibilidade deles também depende dos seguintes componentes: da existência de um pronunciamento jurisdicional passível de impugnação intraprocessual e da previsão legal de alguma espécie recursal que se compatibilize com ele. Em outros termos, não se pode recepcionar recurso algum sem que exista uma decisão que lhe seja vulnerável e, tampouco, sem que o legitimado se utilize da categoria recursal apropriada. Fala-se na “adequação” do recurso, que está diretamente associada à natureza do pronunciamento jurisdicional hostilizado e ao tipo de vício nele identificado pelo recorrente. À guisa de exemplo, se o ato decisório possuir natureza de sentença e o vício indicado pelo legitimado for o erro de julgamento ou de procedimento, o recurso adequado é a apelação (art. 1.009), exceto se o julgado emanar de juiz integrante do sistema dos Juizados Especiais, caso em que é manejável o recurso inominado (Lei nº 9.099/1.995, arts. 41 a 43). Porém, se algum desses erros for assinalado em uma decisão unipessoal do relator (art. 932), no exercício da competência originária do tribunal ou da competência recursal deste, será compatível o agravo interno para o respectivo órgão colegiado, observadas, quando ao processamento, as regras do regimento interno da corte (art. 1.021). Ainda a título de ilustração, contra a decisão de única ou última instância, proveniente de um tribunal de justiça ou de algum tribunal regional federal, é cabível o recurso especial, se o erro judicial significar ofensa a direito federal (CF. art. 105, inc. III). Contudo, se a decisão de única ou última instância violar norma de direito constitucional e a resolução da situação jurídica debatida no processo possuir repercussão geral por envolver questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico, que ultrapassem os limites subjetivos da causa, o recurso pertinente é o extraordinário (CF, art. 102, inc. III). Por seu turno, cabe o recurso ordinário para o Superior Tribunal de Justiça contra a decisão denegatória no habeas corpus julgado em única ou última instância por tribunal de justiça ou tribunal regional federal, contra a decisão denegatória em mandado de segurança julgado em única instância por qualquer dessas cortes, assim também nas causas em que forem partes Estado estrangeiro ou organismo internacional e, de outro lado, município ou pessoa residente ou domiciliada no país (CF, art. 105, inc. II e CPC, art. 1.027, inc. II). No entanto, o recurso ordinário deve ser dirigido ao Supremo Tribunal Federal quando se tratar de decisão denegatória em habeas corpus, mandado de segurança, habeas data ou mandado de injunção, decidido em única instância pelo Superior Tribunal de Justiça, pelo Superior Tribunal Militar, pelo Tribunal Superior do Trabalho ou pelo Tribunal Superior Eleitoral (CF, art. 102, inc. II e CPC, art. 1.027, inc. I). Os embargos de divergência são adequados para impugnar o acórdão de turma que: em recurso extraordinário ou em recurso especial, divergir do julgamento de qualquer outro órgão do mesmo tribunal, sendo os acórdãos, embargado e paradigma, de mérito; em recurso extraordinário ou em recurso especial, divergir do julgamento de qualquer outro órgão do mesmo tribunal, sendo os acórdãos, embargado e paradigma, relativos ao juízo de admissibilidade; em recurso extraordinário ou em recurso especial, divergir do julgamento de qualquer outro órgão do mesmo tribunal, sendo um acórdão de mérito e outro que não tenha conhecido o recurso, embora tenha apreciado a controvérsia; nas causas de competência originária, divergir do julgamento de qualquer outro órgão do mesmo tribunal (art. 1.043). De outro lado, é admissível o agravo em recurso especial e em recurso extraordinário (art. 1.042) contra a decisão do presidente ou vice-presidente do tribunal que: indeferir pedido, formulado com base no artigo 1.035, § 6º ou no artigo 1.036, § 2º, de inadmissão de recurso especial ou extraordinário intempestivo; inadmitir, com base no artigo 1.040, inciso I, recurso especial ou extraordinário sob o fundamento de que o acórdão recorrido coincide com a orientação do tribunal superior; inadmitir recurso extraordinário, com base no artigo 1.035, § 8º, ou no artigo 1.039, parágrafo único, sob o fundamento de que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a inexistência de repercussão geral da questão constitucional discutida. O cabimento do agravo de instrumento fica na dependência da arguição de qualquer espécie de erro judicial nas decisões interlocutórias catalogadas no artigo 1.015 do novo Código, assim também em outras hipóteses previstas em lei, a exemplo da decisão com qual o juiz de primeiro grau conceder ou denegar a liminar no processo originário da ação de mandado de segurança (Lei nº 12.016/2.009, art. 7º, § 1º) e da decisão liminar envolvendo o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer postulada em ação civil pública (Lei nº 7.347/1.985, art. 12). Por último, independentemente da modalidade da decisão judicial, do momento processual em que ela for emitida ou do órgão jurisdicional que a proferir, ela comportará o recurso de embargos de declaração se o defeito apontado pelo recorrente for a obscuridade, a contradição, a omissão ou o erro material (art. 1.022). Diante dessas considerações, é perceptível que cada recurso está vinculado a uma ou mais situações de cabimento e que essa relação de compatibilidade objetiva denominada “adequação” corresponde a um requisito indispensável para a admissibilidade de todos eles. A propósito, nos artigos seguintes estudaremos mais detidamente os recursos no processo civil e, na oportunidade, aprofundaremos a análise das respectivas hipóteses de cabimento.    
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MACIEL, Daniel Baggio. A adequação dos recursos no novo Código de Processo Civil. Página eletrônica Isto é Direito. Fevereiro de 2.015.
NOTA RELEVANTE: Este artigo foi composto segundo os dispositivos constantes do projeto de lei que institui o novo Código de Processo Civil.

domingo, 8 de fevereiro de 2015

O PREPARO E OS PORTES NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Os serviços judiciários são remunerados mediante um complexo sistema de taxas instituídas por lei, em razão do princípio da legalidade (CF, art. 5º, inc. II), que também irradia seus efeitos no campo tributário (CF, art. 150, inc. I). Aliás, insere-se na competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal legislar sobre as custas dos serviços forenses (CF, art. 24), cujas receitas devem ser destinadas exclusivamente ao patrocínio dos serviços afetos às atividades específicas da Justiça (CF, art. 98, § 2º). É por essa razão que cada Estado-membro possui uma legislação própria disciplinando as custas incidentes sobre os serviços judiciários que lhes incumbem. A título de exemplo, é a Lei Estadual nº 11.608/2.003 que normatiza as custas dos serviços prestados no âmbito do Poder Judiciário do Estado de São Paulo. Em Minas Gerais, é a Lei Estadual nº 14.939/2.003 que rege o assunto. No Mato Grosso do Sul, a matéria é regulada pela Lei Estadual nº 3.779/2.009. Na justiça federal de primeiro e segundo grau, é a Lei nº 9.289/1.996 que trata das custas devidas à União, mas convém ressalvar que é regida pela respectiva legislação estadual a cobrança de custas nas causas ajuizadas perante a justiça estadual, no exercício da jurisdição federal, nos casos previstos nos parágrafos 3º e 4º, do artigo 109, da Constituição Federal e no artigo 15 da Lei nº 5.010/1.966. No comum, a interposição dos recursos demanda o recolhimento e a comprovação de uma taxa judiciária denominada preparo. À guisa de exemplo, a referida lei paulista prevê que é de 10 UFESP’s o preparo no agravo de instrumento. Na apelação, ele corresponde a dois por cento do valor da causa, mas na hipótese de pedido condenatório esse percentual deve ser calculado sobre o valor fixado na sentença ou, se ilíquido, sobre o valor arbitrado pelo juiz para esse fim. Entretanto, o preparo nem sempre é a única custa que o recorrente deve suportar. Além dele, também podem ser devidas despesas processuais com o transporte dos autos de uma instância para outra. Dá-se o nome de porte de remessa à despesa com o deslocamento dos autos para o órgão judicial superior incumbido do julgamento do recurso. Denomina-se porte de retorno a despesa com a restituição destes ao órgão judicial de origem do processo. Na justiça estadual, os valores dos portes são definidos por ato do Conselho Superior da Magistratura. Na justiça federal, eles são fixados mediante resolução do Conselho de Administração do tribunal regional correspondente. No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, cabe ao Conselho de Administração deliberar sobre essas despesas (vide Lei nº 11.636/2.007). No Supremo Tribunal Federal, é a respectiva presidência que exerce a atribuição de quantificá-las. Em todo caso, o parágrafo 3º do artigo 1.007 dispensa o recolhimento dos portes nos processos em autos eletrônicos, o que permite a conclusão de que esse tipo de despesa só pode ser exigida quando os autos forem físicos, afinal, é o deslocamento destes que resulta dispêndios a serem suportados pelo recorrente, nos casos legais. Assentadas essas noções, é preciso realçar que a inexistência, a insuficiência, a intempestividade ou a irregularidade do preparo ou dos portes acarreta a inadmissibilidade dos recursos em que eles são devidos, na hipótese de não ser suprida a falta nos casos e formas legais. Para essa penalidade dá-se o nome de deserção. Com efeito, o caput do artigo 1.007 determina que o preparo e os portes, quando exigidos pela legislação pertinente, sejam comprovados no ato da interposição do recurso. Se é assim, não há dúvida que ambos devem ser recolhidos antes dessa oportunidade, a fim evitar a incidência da mencionada pena. Diferente é o tratamento dado ao recurso inominado manejável contra a sentença emanada do Juizado Especial Cível, pois o parágrafo 1º, do artigo 42, da Lei nº 9.099/1.995 admite que o respectivo preparo seja recolhido e comprovado nas quarenta e oito horas seguintes à interposição dessa espécie recursal. Embora não possam ser consideradas exceções à regra segundo a qual o preparo e os portes devem ser provados no momento em que o recurso é interposto, os parágrafos 2º e 4º do artigo 1.007 veiculam duas previsões que a flexibilizam sobremodo. A propósito, o parágrafo 2º estabelece que a insuficiência no valor do preparo ou dos portes apenas implicará a deserção se o recorrente, intimado na pessoa de seu advogado, não vier a supri-lo no prazo de cinco dias, o que envolve o completamento da quantia recolhida anteriormente e a comprovação deste. Por sua vez, na hipótese de interposição do recurso sem a prova do pagamento de qualquer dessas despesas, o parágrafo 4º determina que o recorrente seja previamente intimado, na pessoa do seu advogado, para realizar o recolhimento em dobro, de modo que somente se justifica a aplicação daquela pena se ele não se desincumbir desse ônus. Dotado de uma redação imperfeita, o parágrafo 4º não especifica o prazo para o recorrente comprovar esse recolhimento duplicado. Apesar disso, não é difícil perceber que essa lacuna deve ser eliminada com o emprego da analogia ao mencionado parágrafo 2º, o que atrai o prazo de cinco dias para que o recorrente efetive o mencionado recolhimento e a respectiva comprovação. Contudo, é importante ressalvar que o parágrafo 5º do artigo 1.007 veda a complementação do preparo e dos portes se o recorrente for intimado para recolhê-los em dobro e não realizá-lo integralmente. Por isso, apenas se admite o completamento dessas despesas quando o recorrente provar o recolhimento parcial no ato da interposição do recurso. Flagrantemente defeituosa é a previsão do parágrafo 6º do artigo 1.007, que autoriza o relator a relevar a pena de deserção e a assinar o prazo de cinco dias para o implemento do preparo, quando o recorrente provar que deixou de fazê-lo por justo impedimento. Atribuímos essa pecha ao parágrafo 6º porque, prima facie, ele parece permitir o afastamento da referida pena apenas quando a falta estiver associada ao preparo, não na hipótese de inadimplemento ou ausência de comprovação dos portes por justo impedimento. No entanto, se o recorrente demonstrar a ocorrência de algum evento imprevisto, alheio à sua vontade e que o impediu de recolher ou comprovar qualquer dessas despesas processuais (art. 223, § 1º), o resultado deve ser o mesmo: a remissão da pena de deserção e intimação dele para praticar o ato no prazo de cinco dias (art. 223, § 2º). Superada essa deficiência normativa, cumpre acrescentar que a decisão com que o relator relevar a pena de deserção é irrecorrível, nos termos do parágrafo 6º do artigo 1.007. É assim porque o recorrido que pretender contrariá-la deverá se valer das suas contrarrazões para tanto, oportunidade em que poderá debater o impedimento afirmado pelo recorrente, refutar a prova da sua ocorrência e insistir na aplicação da pena de deserção. Por seu turno, o parágrafo 1º do artigo 1.007 isenta do preparo e dos portes os recursos interpostos pelo Ministério Público, pela União, pelo Distrito Federal, pelos Estados, pelos Municípios, assim também pelas respectivas autarquias e por aqueles que desfrutam de isenção legal, no que se incluem os beneficiários da gratuidade da justiça. Essas isenções são consideradas subjetivas porque deferidas em consideração ao sujeito que se utiliza do recurso. Porém, existem outras que estão concatenadas a determinadas espécies recursais e que independem da figura do recorrente. São as isenções chamadas objetivas, a exemplo daquelas deferidas para os embargos de declaração (art. 1.023) e para o agravo em recurso especial e em recurso extraordinário (art. 1.042, § 2º). No mais, resta enfatizar que o parágrafo 7º do artigo 1.007 neutraliza uma antiga divergência jurisprudencial ao prever que o equívoco no preenchimento da guia de custas não implicará a aplicação da pena de deserção, cabendo ao relator, na hipótese de dúvida quanto ao recolhimento, intimar o recorrente para sanar o vício no prazo de cinco dias. Por essa razão, a inadmissibilidade do recurso motivada em imprecisões dessa natureza só é legítima se o recorrente não adimplir, no prazo legal, a ordem judicial de regularização da respectiva guia, o que também compreende a comprovação dessa providência.
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MACIEL, Daniel Baggio. O preparo e os portes no novo Código de Processo Civil. Página eletrônica Isto é Direito. Fevereiro de 2015.
NOTA RELEVANTE: Este artigo foi composto segundo os dispositivos constantes do projeto de lei que institui o novo Código de Processo Civil.